segunda-feira, 16 de julho de 2012

OS DIREITOS DE PERSONALIDADE DEVEM SER RESPEITADOS POR TODOS


É deveras preocupante a forma como determinados meios de comunicação social reportam e até mesmo julgam determinadas situações, transformando as verdadeiras vítimas em vilões. Esta reflexão vem a propósito da forma como foi reportado o caso de um vídeo referente à vida íntima e pessoal de um concidadão nosso que circulou na Cidade da Beira, ao que parece, sem a concordância dos autores do mesmo. Na minha opinião, o que está em causa não é o facto de se concordar ou discordar que as pessoas registem ou não os seus momentos íntimos mas sim o facto de todos os cidadãos, nos seus espaços privativos e de fórum íntimo, serem livres de agirem em função das suas próprias consciências. Assim, penso que, a principal preocupação de qualquer pessoa e principalmente dos jornalistas deveria ser a de se condenar e se responsabilizar as pessoas que, de má-fé e agindo com dolo, fizeram chegar a praça pública essas imagens privadas. No entanto, o que se verifica é que estamos a agir de forma contrária, estamos a transformar a vítima em culpada. Espanta-me quando determinado jornalista diz ter contactado com o Director Nacional do INGC, na qualidade de superior hierárquico do protagonista do vídeo, como se fosse da responsabilidade do referido Director cuidar ou limitar os direitos de personalidade do seu subalterno. É urgente promover-se a capacitação dos nossos jornalistas em determinadas matérias e muito em particular no respeitante aos direitos de personalidade como forma de evitar-se este tipo de situações que em nada dignificam a profissão e atentam contra os direitos fundamentais do cidadão, nomeadamente, os direitos de personalidade.

Os direitos de personalidade são direitos fundamentais e estão consagrados na Constituição da Republica de Moçambique (artigo 41) que dispõe, taxativamente, que todo o cidadão tem direito a honra, ao bom nome, a reputação, a defesa da sua imagem pública e a reserva da sua vida privada. O Código Civil, no art. 80 estabelece a obrigação geral de todos guardarem reserva da vida privada de outrem e, o art. 70 do mesmo, vem a estabelecer que a lei protege os indivíduos contra ofensas à sua personalidade moral e dá a possibilidade ao ofendido de intentar uma acção de responsabilidade civil contra o ofensor e de requerer outras providências adequadas a atenuar os efeitos da ofensa cometida.

Deste modo, nos termos da lei aquele que atentou contra o direito de reserva da vida privada do nosso concidadão trazendo ao público um acto privado e praticado na intimidade do casal é que é o ofensor e que deve ser o alvo destes ataques que agora vemos na imprensa. Mas, o que verificamos é exactamente o contrário, ao invés de determinados jornalistas cumprirem com o seu dever de informar na estrita observância dos direitos de personalidade dos outros, contribuem, ainda mais, para denegrir a imagem de quem já se encontra fragilizado. Esta inversão de valores é intolerável, não podemos admitir que num Estado de direito aqueles que têm a obrigação de cumprir com o estabelecido na Constituição da Republica e nas leis se tornem no principal veículo de ofensa aos direitos de personalidade de outrem. Pois, no caso do nosso concidadão, além das pessoas que levaram ao público o vídeo de carácter privado, os jornalistas tiveram um papel fundamental na disseminação desta informação ao nível nacional com a agravante de, por arrasto, afectarem o bom nome de outras pessoas, que, querendo ou não, são figuras públicas no nosso cenário político. Foi a acção dos jornalistas que levaram ao conhecimento público as relações de familiaridade entre o protagonista do vídeo e um dos nossos membros do Governo. Na minha opinião, os jornalistas que assim agiram podem ser considerados de co-autores da ofensa aos direitos de personalidade dos cidadãos afectados.

Sou da opinião de que constitui obrigação de qualquer jornalista ter um conhecimento mínimo das leis em vigor de modo a que ao escreverem determinadas peças jornalistas que podem pôr em causa determinados direitos, façam-no com a devida cautela salvaguardando os direitos de personalidade das pessoas envolvidas, sob o risco de um dia virem a ser processados ou verem o seu jornal sancionado pelo Conselho Superior da Comunicação Social. É que o desconhecimento da lei não desresponsabiliza o violador da mesma. Além do dever dos jornalistas acima referido, julgo que é também nosso dever, como cidadãos e como educadores, chamarmos a atenção quando constatamos a violação das leis em vigor, e é na qualidade de docente do curso de licenciatura em jornalismo que escrevo o presente artigo de opinião.

Concordo que um dos objectivos de qualquer jornalista é o de vender o seu jornal, mas dado ao papel fundamental que a imprensa desempenha em qualquer Estado de Direito, é necessário que esta imprensa seja o exemplo no cumprimento da Constituição da Republica e das leis em vigor sendo também o protagonista na disseminação dos direitos fundamentais dos cidadãos de modo a contribuir para o exercício pleno da cidadania. Portanto, penso que a atitude mais racional e consentânea com a profissão nobre de jornalista seria a de contribuir na busca do responsável pela divulgação destas imagens que atentam contra os direitos de personalidade dos protagonistas das mesmas e exigir-se que a empresa que teve sob sua custódia o computador para reparação seja investigada e devidamente responsabilizada, caso se prove a sua participação na divulgação propositada das imagens. A atitude reprovável dos agentes da publicitação indevida de cenas privadas e dos jornalistas que disseminaram esta informação transformou a vítima em culpada, contribuindo para uma inversão de valores intolerável.

A liberdade de imprensa e o direito a informação implica ou deve implicar, necessariamente, uma responsabilidade acrescida face aos direitos de personalidade das pessoas afectadas pelas informações que são disseminadas. Defendo o respeito pelo direito a informação e pela liberdade de expressão da mesma forma que defendo o respeito pelos direitos fundamentais das pessoas. Portanto, cabe a cada um de nós enquanto cidadãos promover a defesa destes direitos e contribuir para o exercício responsável dos mesmos por toda a sociedade. Ninguém deve estar acima da lei e o jornalista tem uma responsabilidade acrescida nesta matéria e não deve subtrair-se a sua responsabilidade sob qualquer pretexto.


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