terça-feira, 30 de outubro de 2012

OS BURACOS E AS CRATERAS NAS ESTRADAS E PASSEIOS DA CIDADE DE MAPUTO: A QUEM PEDIR SOCORRO?



Em meados deste ano escrevi, neste mesmo espaço, sobre o problema das estradas e passeios da nossa cidade, problema este que afecta os munícipes bem como os visitantes desta cidade e causam mau aspecto à mesma.

Na altura foi-nos dito, pelo Município de Maputo, que o mesmo não podia reabilitar as estradas em época chuvosa mas, estranhamente, a época seca chegou e foi-se embora sem que o nosso Município reabilitasse as estradas. Uma vez mais, as desculpas não se fizeram esperar, desta feita, a justificação usada foi a de que não havia alcatrão no mercado nacional e portanto, teríamos de aguardar pela chegada do alcatrão que na altura estava em processo de importação. Desde essa altura para cá, nada foi feito, salvo uma e outra intervenção pontual. Enquanto isso, os cidadãos e demais utentes das estradas desta Cidade vão arcando com as consequências da má gestão municipal que se tornou uma dura realidade nos últimos tempos.

Estamos outra vez a entrar para a época chuvosa, aquela que já nos foi dito não ser a mais apropriada para se realizar a manutenção e reabilitação de estradas, e verificamos com preocupação que, já no início desta época, as estradas já estão num estado lastimável, o que será das nossas estradas no final da época chuvosa? Se já agora o cidadão pensa duas vezes antes de colocar o seu carro nas estradas desta cidade, mas tem de o fazer porque não dispõe de outras alternativas de transporte, o que dirá depois da época chuvosa? Por que será que sempre são os cidadãos os eternos sacrificados? Estaremos nós os cidadãos órfãos das entidades encarregues da gestão municipal? Até quando teremos de suportar esta situação?

Actualmente o nosso Município faz-se de cego, surdo e mudo e simplesmente escusa-se de justificar a razão do estado lastimável das nossas estradas, no entanto, qualquer munícipe atento verifica que nos troços mais danificados está-se a utilizar cimento ao invés do alcatrão para tapar os buracos mais profundos nas estradas. Será que até hoje estamos a espera do alcatrão importado há alguns meses atrás? Será que o Município na sua já característica apatia esperou acabar o alcatrão no mercado nacional para proceder a sua importação? Será que são os munícipes que têm de, uma vez mais, ser responsabilizados pela má gestão e falta de planificação dos nossos órgãos municipais? Que Estado de direito é este em que os direitos dos cidadãos são constantemente e impunemente postos em causa?

Hoje, diante da vergonhosa situação vivida nas nossas ruas e nos passeios, surgiu a iniciativa de se tapar os buracos com cimento e em época chuvosa.

Confesso que não obstante ao facto de pouco entender de construção civil e de não ter nada contra o uso de cimento para tapar buracos e ainda mais em época chuvosa, não estou muito confiante de que os nossos técnicos municipais estejam a seguir escrupulosamente com o estipulado neste tipo de material de construção e nesta época do ano para que não voltemos a ter brevemente buracos nos mesmos locais. Pela lentidão ou até mesmo aparente falta de vontade demonstrada pelas equipas que estão no terreno tenho sérias dúvidas de que os famosos buracos e crateras serão de facto tapados ainda neste ano.

Caros leitores, todos sabem que o nosso país não produz alcatrão assim como sabem que também não produz uísque. No entanto, verificamos que diferentemente do uísque, que nunca falta no nosso mercado, o alcatrão está sempre em falta porque a entidade responsável pelo processo de importação não tem a capacidade de perceber que o alcatrão é prioritário e devia ser importado com a devida antecedência. Qual é a razão desta situação? Não estaremos aqui perante uma manifesta falta de planificação? De quem é a responsabilidade disto? E porque é que devem ser sempre os cidadãos a suportar a falta de planificação de quem tem por obrigação servir ao cidadão e não servir-se do cidadão? Fico, cada vez mais, surpreso quanto as reais prioridades de desenvolvimento do nosso país.

Dentro de alguns dias comemora-se mais um aniversário desta nossa cidade e ao invés de celebrarmos com alegria e dignidade esta data festiva, fazemo-lo com lamentações e pena do estado de abandono, desleixo e deixa andar a que está votada a nossa cidade. Ora, caro e estimado Edil, quando é que de facto teremos as estradas em condições de circular decentemente? Quando é que o cidadão poderá sentir que de facto valeu a pena pagar os impostos e renovar ciclicamente o seu contrato social com os governantes municipais da nossa cidade? Em suma, quando é que os buracos e as crateras deixarão de ser a referência obrigatória da nossa cidade e passarão para a história como uma triste recordação.

Enquanto isso e dada a morosidade neste trabalho de emergência, os amortecedores das nossas viaturas vão se danificando, alguns acidentes de viação vão ocorrendo mas ainda assim o Estado vai cobrando os impostos que são devidos pelo cidadão para depois repassar, parte deles, ao Município (Compensação Autárquica) para além do imposto automóvel que todos os utentes das viaturas pagam directamente ao Município.

Portanto, o Município vai recebendo as verbas e colectando os impostos mas a mesma não é devidamente aplicada na melhoria da vida dos seus munícipes e nada se diz do que se faz com ela no final do ano económico. É tempo de começarmos a exigir a prestação de contas públicas, pois não se percebe o porquê de, por um lado se colectar os impostos e por outro lado não se reabilitar as estradas e mesmo assim, terminado o ano económico, não se procede a devolução dos impostos cobrados indevidamente pelo Estado (Município) ao cidadão. Afinal os impostos não são uma comparticipação do cidadão nos serviços a serem prestados pelo Estado? Não se realizando o fim a que se destinam, o mais lógico e sensato não seria o de o Estado e neste caso em apreço o Município devolver o imposto indevidamente cobrado ao cidadão?  

Por algum motivo decidiu-se pela descentralização da colecta do imposto automóvel e outros e creio que a maior razão se prendia exactamente com a falta de liquidez por parte dos Municípios para arcarem com os custos de manutenção periódica das estradas. Ora, se mesmo com recursos adicionais não se consegue proporcionar estradas condignas aos cidadãos então que se devolva directamente ao cidadão o imposto que se colectou ou então ao Governo central para que a verba seja investida em outras áreas de real impacto na vida dos cidadãos. O que não se admite ou não devíamos aceitar é que se colecte impostos e, não obstante não se saber da sua real aplicação, deixemos que a verba fique na alçada do Município e seja sujeito a outras aplicações que muitas das vezes não têm a ver com a melhoria das nossas vidas que é a razão de pagar-se os impostos. O cidadão encontra-se hoje numa situação em que é obrigado a contribuir para o melhoramento das vias do Município, mas encontra-se impedido de beneficiar daquilo que seria consequência directa da sua contribuição - a melhoria das vias. Para piorar a situação, o cidadão é ainda obrigado a ter a sua viatura em condições de ser aprovada nas inspecções periódicas. Que pacto social é este que só uma parte é que cumpre? A quem o cidadão deverá pedir socorro para inverter este triste e lamentável cenário?

 

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A QUALIDADE DA GASOLINA QUE CONSUMIMOS: À QUEM EXIGIR RESPONSABILIDADES?


Nas últimas semanas têm sido reportados vários casos relacionados com avarias de viaturas ligeiras alegadamente por causa de problemas derivados da qualidade da gasolina comercializada na nossa cidade capital e quiçá no resto do país e que tem como consequência a danificação das bombas de gasolina das viaturas e outros equipamentos da mesma. Estranhamente nenhuma autoridade governamental quer seja ao nível central quer ainda ao nível municipal se dignaram em prestar algum esclarecimento público sobre a matéria não obstante o caso ter já merecido um destaque noticioso e uma reportagem por parte de uma televisão e de um jornal privado reportando a gravidade e o número de casos até ao presente ocorridos. O mais caricato é que o cidadão, não obstante pagar o imposto automóvel (IA), o imposto pessoal autárquico (IPA), o imposto sobre o rendimento da pessoa singular (IRPS), entre outros impostos, não tem uma estrada em condições de circular e por consequência tem de substituir regularmente os amortecedores e outras peças da sua viatura e agora, como se não bastasse, tem ainda de substituir as bombas de gasolina e deitar fora todo o combustível do depósito. Uma vez mais ninguém assume a responsabilidade por estes danos e não encontramos da parte do nosso Estado qualquer tipo de protecção à esta situação vivida pelos Moçambicanos. Ao Estado, na qualidade de representante dos cidadãos e na qualidade de agente regulador e fiscalizador da actividades das empresas privadas que se dedicam à importação e comercialização de combustível, cabe apurar responsabilidades e aplicar as devidas sanções pelos danos que estão a causar aos cidadãos, pois trata-se de uma situação pública e notória que deveria, de imediato, gerar, ao nível do Estado, uma acção na tentativa de se apurar os reais contornos do problema e quais as eventuais consequências que este combustível pode provocar nos automóveis  e por consequência nos bolsos dos consumidores. É este o contrato social celebrado entre os cidadãos e o Estado. Como é que se pode elevar a auto-estima do cidadão se todos os dias surgem adversidades que inviabilizam e lesam a dignidade e os direitos fundamentais do cidadão e ninguém vem em seu socorro? Será possível que num estado de direito os cidadãos não tenham os seus direitos salvaguardados pelo Estado? A quem o cidadão deve dirigir-se pedindo responsabilidades se aqueles com quem celebrou um contrato social até ao momento continuam “mudos” diante da sua desgraça?

O mais grave pode estar ainda por vir caso as autoridades governamentais não se organizem para lidar de forma célere e eficaz com esta situação. Estou a imaginar as consequências caso está situação se mantenha e se alastre para outro tipo de combustível, por exemplo o combustível que abastece os nossos aviões. Espero que o diabo seja surdo e que esta calamidade acabe imediatamente e não afecte aos nossos aviões. Outro perigo também eminente é o caso desta calamidade vir também a afectar os “chapa cem” com todas as consequências sociais que conhecemos. Portanto, mais do que nunca deve-se exigir das autoridades governamentais um pronunciamento célere e convincente sobre o que está de facto a passar-se e a quem deve-se exigir responsabilidades na reparação dos danos sofridos. Recordo-me que o nosso Parlamento aprovou a Lei de defesa do consumidor e que na altura compareceram na sessão parlamentar as organizações de defesa dos direitos dos consumidores mas não se vê, até ao presente momento, nenhum pronunciamento destas mesmas organizações. Enquanto isso o pobre cidadão vai ter de fazer das tripas o coração e com o já magro rendimento ter ainda de suportar as despesas extras com a reparação das suas viaturas. Até quando o cidadão terá de suportar estas injustiças todas?  Porquê que a entidade responsável pela importação, armazenamento e comercialização do combustível não presta um esclarecimento público sobre o que está de facto a acontecer, quais os cuidados que deve-se ter, em quais bombas pode-se com segurança abastecer as viaturas, a quem requerer a indemnização pelos danos sofridos até ao momento, quais os cuidados que estão a ser tomados para evitar que está situação atinja os aviões, quais as medidas adoptadas para corrigir definitivamente a situação, etc. Estas e outras questões deveriam ser devidamente esclarecidas o mais breve possível.

Defendo que o Conselho de Ministro deveria nomear uma comissão de inquérito multissectorial que inclua especialistas da área dos combustíveis, da polícia de investigação criminal (PIC) e do Serviço de Inteligência e Segurança do Estado (SISE) para efectuar uma investigação mais aturada sobre este assunto de modo a tomar-se a decisão mais certa e duradoura sobre este tipo de ocorrência.

Hoje esta calamidade só está a atingir os carros movidos a gasolina mas ninguém garante-nos que as viaturas movidas a gasóleo não venham também a ser atingidas. Portanto, exige-se uma atitude célere e contundente das nossas autoridades governamentais e uma maior responsabilidade comercial da entidade responsável pelo processo de importação, armazenamento e comercialização destes preciosos líquidos que fazem mover ou paralisar a economia de um país.

 

 

 

 

 

 

 

domingo, 21 de outubro de 2012

A REFORMA DO SERVIÇO NACIONAL DAS PRISÕES EM MOÇAMBIQUE



2. O melhor aproveitamento da mão-de-obra reclusa na promoção da economia nacional.


O cenário que se vive hoje em muitas cidades moçambicanas, particularmente a de Maputo e Beira é a existência de centros de reclusão nos centros destas cidades. Este factor, quanto a mim, dada a exiguidade de espaço, impede de certa forma, a que sejam desenvolvidos projectos, no interior destes centros de reclusão que tornem os mesmos auto sustentáveis e torne a população numa população activa e que contribua para a economia moçambicana.

Deste modo, proponho para esta edição, uma continuação da reflexão iniciada na edição passada acerca das prisões moçambicanas.

Dado ao cenário acima referido surgem-me as seguintes questões: Haverá, de facto, alguma razão ponderosa de se manter as cadeias nos centros das cidades e a população prisional ociosa como acontece actualmente ou esta situação decorre da herança do passado colonial? Será que estaremos de facto a contribuir para a reabilitação dos reclusos e para a reintegração dos mesmos na vida em sociedade ao deixarmos que os mesmos permaneçam dias, meses, e anos fechados nas suas celas e levando uma vida ociosa? Será que é justo que os Moçambicanos paguem a factura elevada para sustentar os reclusos enquanto os mesmos permanecem enclausurados e ociosos? Será que estes reclusos estão livres do dever de contribuir para a economia do país e para o desenvolvimento do mesmo? O que impede que se construam centros de reclusão fora das cidades onde os reclusos possam praticar actividades agro-pecuárias ou outras que possibilitem custear a sua permanência nas cadeias, melhorar a dieta alimentar e até contribuir para a economia nacional? Não será agora altura de adoptarmos políticas de aproveitamento da mão-de-obra reclusa, à semelhança de outros países amigos?

Estas e outras questões levantam-se à volta do tema hoje em reflexão.

No que se refere ao aproveitamento da mão-de-obra reclusa, certamente que haverá quem questione acerca dos Direitos Humanos destes reclusos e acabe por concluir que o aproveitamento desta população consubstanciaria numa violação dos direitos humanos dos mesmos.

No entanto, salvo melhor entendimento, temos de ter em conta que as concepções acerca dos direitos humanos dependem da perspectiva em que se analise a questão. Por exemplo, os reclusos em idade economicamente activam que se mantêm anos numa cela sem nenhuma actividade geradora de rendimentos e um recluso que esteja enquadrado numa actividade geradora de rendimentos nos mais variados ramos de actividade quem destes dois tem os seus direitos humanos melhor salvaguardados?

Portanto, sou da opinião que pôr os prisioneiros a trabalhar e a contribuir para a sociedade não consubstancia uma violação dos direitos humanos. Este exemplo vem a propósito das críticas que têm sido formuladas às autoridades chinesas por, alegadamente, enviarem prisioneiros para trabalhar nas obras de construção civil realizadas pelas empresas públicas chinesas em África. Pessoalmente, penso que os reclusos chineses a quem lhes é concedida a possibilidade de cumprir as suas penas nessas modalidades, têm os seus direitos humanos melhor salvaguardados e a sua reinserção social no mercado de trabalho assegurada quando comparado aos modelos de reclusão ocidentais e que muitos dos nossos países adoptaram e aceitamos como sendo os mais adequados.

O nosso Orçamento de Estado é exíguo e os cidadãos já pagam elevados impostos que deveriam ser investidos na melhoria das condições de vida da população em geral, cabendo aos centros de reclusão criar as condições de auto – sustento e até mesmo de geração de rendimentos que reforçassem os exíguos orçamentos dos nossos centros educacionais e sanitários ao longo de todo o país. Ao estado caberia assegurar a segurança adequada dos locais de reclusão, a assistência medica e medicamentosa apropriada e a oferta de cursos de capacitação profissional, cabendo a população reclusa contribuir para a sua própria alimentação e até mesmo retribuição a sociedade através da prestação de diferentes serviços para a sociedade e para a economia nacional.

Recordo-me que na década de 80, eram os reclusos que realizavam a limpeza e outras actividades afins nas camaratas dos estudantes do curso de relações internacionais na Escola Central do Partido Frelimo na Matola onde encontrávamo-nos alojados nessa altura. Portanto, há muitas formas de ocupar e rentabilizar a população reclusa de modo a contribuir para ela própria e para a sociedade em geral.

Deste modo, convido toda a sociedade moçambicana a reflectir sobre esta questão e emitir as suas opiniões acerca das soluções que podem ser adoptadas para a solução do mesmo. O que estou certo é que não é justo que os membros da sociedade, que são os que sofreram com os actos ilícitos praticados pelos reclusos e que os conduziram a prisão, venham depois a ter que contribuir para o sustento dos mesmos durante a sua vida em reclusão.

Decerto que os constrangimentos acerca da disponibilidade de recursos serão apontados como um dos factores que impedem a transferência das cadeias para fora das cidades mas será que não é preferível redefinir-se agora algumas rubricas do orçamento do Estado para se alcançar, a médio e longo prazo, um impacto positivo neste mesmo orçamento através de uma diminuição dos custos decorrentes da sustentabilidade das cadeias?

Assim, sou da opinião que qualquer alteração das condições actuais visando um aproveitamento da mão-de-obra reclusa deve necessariamente ser acompanhada de um reforço significativo dos mecanismos de segurança para evitar a evasão dos mesmos aquando da realização das actividades que lhes sejam acometidas.

Actualmente, com o avanço da tecnologia existem vários instrumentos e mecanismos que podem ser adoptados e que contribuirão para o reforço da segurança.

Por outro lado, defendo que, paralelamente às acções que possam ser adoptadas para pôr os reclusos a contribuir para a sociedade é necessário que a sociedade reflicta acerca da adopção de penas alternativas destinadas aos que cometem pequenas infracções, descongestionando assim as cadeias.  

terça-feira, 16 de outubro de 2012

A REFORMA DO SERVIÇO NACIONAL DAS PRISÕES EM MOÇAMBIQUE


1.  A conversão dos dejetos humanos em bio-gás para aquecer os fornos das cozinhas das prisões.

Há mais de 37 anos que as nossas autoridades governamentais têm vindo a ensaiar vários modelos de gestão dos serviços prisionais tendo em vista proporcionar aos cidadãos condenados à penas de prisão o cumprimento das mesmas em condições humanamente aceitáveis e a preparação dos mesmos para a sua reintegração futura na sociedade de modo a reduzir-se os casos de reincidência criminal após o cumprimento das penas de prisão.

As nossas cadeias albergam o dobro da capacidade instalada e, não obstante os esforços até ao presente momento havidos, que se prendem com a ampliação e reabilitação das cadeias existentes e na construção de novas cadeias; o problema da superlotação, sustentabilidade, salubridade, viabilidade e segurança das cadeias persistem e, em alguns casos, tendem a agravar-se. Portanto, é urgente fazer-se uma reflexão profunda sobre a matéria e tomar-se as decisões mais acertadas e sustentáveis com vista a inverter-se este triste cenário a curto e médio prazo.

Hoje pretendo refletir e discutir sobre a necessidade de se adoptar novas estratégias para a gestão dos resíduos humanos dos reclusos.

Actualmente as prisões têm recorrido às fossas sépticas para eliminar resíduos humanos e que representam um risco crescente de saúde para os reclusos e funcionários penitenciários. No entanto, não se faz o devido aproveitamento destes dejectos visto que os mesmos podem ser transformados em combustíveis alternativos que poderiam ser utilizados tanto para melhorar as condições de saúde e higiene nas cadeias como para reduzir em mais de 30% a quantidade de madeira normalmente utilizada para cocção de alimentos nas prisões e assim reduzir-se o impacto orçamental actual das prisões moçambicanas.

Consultando, na internet, a página oficial do Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV), apercebi-me de uma experiência bem-sucedida no Ruanda e que acredito que poderia ser perfeitamente adaptável ao nosso contexto e com resultados satisfatório tanto na melhoria das condições de saúde e higiene dos prisioneiros e funcionários penitenciários como na preservação das nossas florestas e na racionalização dos gastos com a aquisição de lenha, carvão ou gás utilizado na confecção dos alimentos. É que os dejectos humanos são uma rica fonte de energia, quando convertidos em biogás.

De acordo com o CICV, as fossas sépticas eram um crescente risco de saúde tanto para os prisioneiros como para os funcionários penitenciários no Ruanda mas, graças a um projecto do CICV, os dejectos humanos passaram a ser convertidos em biogás que é hoje utilizado para aquecer os fornos das cozinhas nas prisões.

O CICV concebeu um programa visando construir e reformar os sistemas de biogás em várias prisões ruandesas. Esses sistemas reduziram em pelo menos 30% a quantidade de madeira normalmente utilizada para cocção de alimentos nas prisões e representam hoje uma alternativa energética de longo prazo que podem reduzir gradualmente a pressão sobre os recursos florestais do Ruanda e além do biogás, esses sistemas produzem ainda resíduos líquidos e compostos que podem ser utilizados para fertilizar a terra.

Portanto, penso que as nossas autoridades governamentais deveriam aproveitar a experiência ruandesa para tornar mais humanas as condições nas nossas cadeias e para reduzir os custos da aquisição de lenha, gás e carvão normalmente utilizados na confecção de alimentos nas nossas cadeias. Os resíduos líquidos e compostos também produzidos por estes sistemas poderiam contribuir na melhoria da produção agrícola nas nossas cadeias de modo a minimizar os gastos com a compra de alimentos e contribuir decisivamente na diversificação e melhoria da dieta alimentar dos prisioneiros e dos funcionários penitenciários.

Penso que o Serviço Nacional de Prisões do nosso país em parceria com a Universidade Eduardo Mondlane poderia, perfeitamente, conceber um programa neste sentido e solicitar a assessoria do CICV com vista a transferência das habilidades e competências acumuladas no Ruanda para as nossas autoridades penitenciárias.

É tempo de começar-se a pensar em estratégias que tornem mais sustentáveis as prisões moçambicanos e menos ociosas a sua população prisional. Pois, tudo isso pesa no bolso dos contribuintes moçambicanos e no Orçamento do Estado.

(Continua na próxima edição)

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

SERÁ QUE O SEGREDO DA DESPARTIDARIZAÇÃO DO ESTADO NÃO ESTÁ NA SUA EXCESSIVA PARTIDARIZAÇÀO? É que a bebida ingerida em excesso embebeda.


Partilho hoje convosco um artigo de opinião que publiquei em 2007 num dos jornais da praça mas que dada a sua actualidade e pertinência, julguei oportuno voltar a publicar neste espaço de opinião. Trata-se da minha percepção sobre a partidarização do Estado em Moçambique e dizer antes de mais que considero válido e importante tudo que já se escreveu sobre esta temática.

Refiro-me aqui as denúncias quase diárias, na nossa imprensa, sobre a proliferação das células do partido no poder em todas as instituições do Estado, salvo raras excepções, sobre os panfletos de propaganda eleitoral afixado nos gabinetes dos administradores distritais e outros dirigentes, a partidarização dos eventos de Estado, etc.

Portanto, em Moçambique, ninguém comprometido com a construção de uma cidadania inclusiva e participativa e com o Estado de Direito pode negar esta triste realidade.

Todos nós conhecemos inúmeros exemplos de funcionários públicos que enquanto não assumam uma posição político-partidária contrária ao poder político instituído são considerados quadros capazes e necessários ao processo de desenvolvimento, mas, assim que estes funcionários assumem uma posição pública à favor de algum partido da oposição ou não comunguem das posições oficiais ou ainda não aceitem “por livre iniciativa” aderir ao partido no poder, deixam de ser quadros úteis e necessários e passam a ser automaticamente quadros dispensáveis mesmo que continuem no Estado e beneficiem das promoções e progressões na carreira mas não passam disso.

Todavia, mesmo diante de todos os indicadores que apontam para o regresso da intolerância e dos dogmas totalitários, prefiro ser optimista e acreditar que nenhum tirano nos irá escravizar e que tudo que tem começo tem fim.

Uma das razões que me leva a pensar deste modo relaciona-se com o facto de uma parte da elite intelectual e até mesmo de uma certa ala do partido no poder, estar a enfrentar dificuldades em conviver com toda esta situação por mais tempo. É que assim está-se a prejudicar a economia do país e a torná-la ineficiente pois passamos a viver a situação de termos recursos subaproveitados o que não se compadece com as inúmeras necessidades da nossa sociedade.

Uma razão mais forte do meu optimismo relaciona-se com o facto de eu acreditar que o segredo da despartidarização do Estado está exactamente nesta excessiva partidarização.

A bebida ingerida em excesso embebeda. O início da queda da maioria dos regimes totalitários no mundo foi geralmente acompanhado pelo endurecimento precipitado nas últimas fases desses regimes.

Determinados governantes deste país ao privilegiarem a confiança politica em detrimento da competência técnica dos funcionários do Estado estão a criar as premissas para que o péssimo funcionamento dos Serviços públicos não só prejudique ao público em geral como também as próprias elites governativas e até ao próprio Chefe de Estado. Quem não se lembra do embaraço que o nosso Chefe de Estado teve diante da avalanche das inconstitucionalidades no seu primeiro mandato, incluindo até do próprio Órgão do Estado encarregue de gerir e profissionalizar a função pública.

Quero acreditar que o Chefe de Estado tarde ou cedo chegará á conclusão que ao se promover o culto a personalidade e a fidelidade partidária ao invés da competência técnica e a profissionalização do Estado, não lhe levará a bom porto.

Os mesmos “camaradas” que aconselharam mal o Presidente Chissano e hoje se armam em comandantes mores do “combate ao espírito do deixa andar” são os mesmos que hoje “aconselham” ao actual Presidente da Republica a pactuar com a incompetência em detrimento da excelência e da qualidade e no próximo mandato serão os mesmos a criticarem o actual PR por ter cometido erros absurdos enquanto Presidente da República.

São estes “messias” que levaram o actual Presidente da República a abraçar de forma pouco convincente a aposta na produção da Jartropha, são os mesmos que produziram os despachos inconstitucionais, são os mesmos que mandataram as entidades publicas a adoptarem slogans partidários mesmo conscientes de que estamos num Estado de Direito, são os mesmos que introduziram um novo currículo no ensino superior sem tomar em consideração a realidade actual do nosso ensino primário e secundário e as condições de trabalho nas universidades, são os mesmos que levaram o governo a anunciar a cesta básica para tempos depois voltar atrás com a decisão tomada, são os mesmo que planificaram as inspecções obrigatórias dos carros e depois não sabem dizer quando será obrigatório, são os mesmos que disseram que os cartões dos telemóveis deviam ser registados obrigatoriamente e hoje já não sabem dizer a partir de quando será obrigatório, são os mesmos que “planificaram” a aplicação dos “vulgo” sete milhões nos distritos e que hoje reconhecem, nos vários estudos, terem errado, mas não dizem onde erraram, etc, etc....

 

Penso que ninguém em sã consciência e muito menos o país pode dar-se ao luxo de dispensar talentos e capacidades por meros caprichos de confiança ou fidelidade política.

 

Por isso, espero que o nosso Chefe de Estado dedique todas as suas energias na defesa, promoção e consolidação da unidade nacional, dos direitos humanos, da democracia e do bem-estar do povo moçambicano e faça justiça a todos os cidadãos (n° 2 do artigo 150 da Constituição da Republica de Moçambique) e salve deste modo a nossa pátria destes falso messias.

 

Mas, mais do que esperar que os efeitos da partidarização possam eles próprios forçar a despartidarização, julgo que todos nós não somos poucos para juntos fazermos algo concertado e viável para que este pesadelo passe á história de uma época menos boa do nosso país.

 

Só assim é que poderemos produzir a riqueza nacional, reparti-la igualmente ou equitativamente entre os cidadãos e não permitirmos eternamente que a retórica continue a substituir, na maior parte das vezes, as acções.

 

Pelo que apelo a todos e muito em particular aos intelectuais deste nosso Moçambique para que se libertem e passem a denunciar de viva voz todo este macabro plano que visa perpetuar o subdesenvolvimento e a dependência externa do nosso País.

A geração do 25 de Setembro cumpriu com a sua nobre missão de libertar a terra e os homens do jugo colonial, cabe agora a nossa geração contribuir de forma determinante para a libertação das mentes dos homens e mulheres deste maravilhoso país.

Penso que é e deve ser um imperativo nacional a construção de uma cidadania inclusiva e participativa, capaz de ser ouvida e respeitada, através do exercício pleno dos direitos e liberdades garantidos pela Constituição da República de Moçambique.

 

 

terça-feira, 2 de outubro de 2012

O PAPEL DO EXÉRCITO EM TEMPO DE PAZ


Há mais de 20 anos que a guerra terminou e novos desafios se impõem ao país e ao exército moçambicano. Durante este período a Academia Militar Marechal Samora M. Machel foi modernizada e novos cursos foram introduzidos mas pouco se fala e se vê do real impacto desta instituição na vida dos moçambicanos. Num país onde nem sequer existe uma marinha de guerra e muito menos uma força aérea, penso que valeria a pena repensar-se nos curricula da Academia Militar e no papel do exército na sociedade. Em muitos países o exército no tempo de paz tem desempenhado um papel extremamente importante nas várias frentes e actividades que contribuam para o desenvolvimento socioeconómico do país. A academia militar para além de leccionar cursos de longa duração nas mais variadas áreas do saber, deveria também leccionar cursos de curta duração de forma a conciliar a sua formação para a vida militar com a vida civil após a desmobilização bem como de forma a preparar estes militares para que os mesmos contribuam nas várias frentes de actividades relacionadas ao desenvolvimento do país e produzirem um real impacto na vida das pessoas.

Neste contexto, julgo que valeria a pena repensar nos cursos actualmente leccionados pela Academia Militar Marechal Samora M. Machel em Nampula introduzindo-se cursos de curta duração nas áreas de construção e manutenção de estradas e pontes, canalização, carpintaria, serralheira, mecânica, electricidade, torneiro mecânico, operador de gruas, maquinistas, auxiliares de enfermagem, topografia, motoristas, entre outras especialidades as quais seriam de vital importância nesta fase de desenvolvimento do nosso vasto país e possibilitaria o emprego ou até mesmo o auto emprego após a passagem para a vida civil como também um melhor aproveitamento destes recursos humanos durante a permanência dos mesmos no serviço militar obrigatório.

Os militares habilitados nestas áreas ao invés de permanecerem ociosos nos quartéis, poderiam ser enquadrados nas actividades de construção, reparação e manutenção de estradas e pontes, na construção e reabilitação de escolas e postos de saúde, na abertura de furos de água, na abertura de picadas, no transporte de material de construção para obras públicas, na construção de diques e outro tipo de reservatórios de água nas comunidades rurais, no programa de electrificação rural, na prestação de serviços de enfermagem nos hospitais e centros de saúde, na leccionação nos cursos de alfabetização de adultos, na limpeza de valas de drenagem, nas actividades de combate à erosão costeira e doutro tipo de erosão, na produção alimentar destinada aos quartéis e lares escolares, na assistência técnica das viaturas do Estado afectas aos sectores da educação, saúde e agricultura entre outros, nas actividades visando a infra-estruturação de terrenos destinados ao programa de habitação e na construção de habitação social, etc.

Em tempo de paz, muitos recursos têm sido despendidos pelo Estado moçambicano na alimentação e permanência dos soldados nos quartéis bem como na contratação de serviços públicos, que poderiam muito bem ser efectuados pelos soldados e à custos reduzidos, nas varias actividades visando o alívio da pobreza e o desenvolvimento social do nosso país. Num país ainda carente de quase tudo e com muitos desafios de desenvolvimento, não nos podemos dar ao luxo de dispor de tanta mão-de-obra ociosa que tem um grande potencial para contribuir para a minimização dos nossos problemas quotidianos.

A lei do serviço militar obrigatório em vigor prevê a prioridade, de quem cumpriu o serviço militar, no acesso ao mercado de emprego; no entanto, o nosso mercado de emprego, dia após dia, está a tornar-se mais competitivo e a pré-condição de experiência profissional anterior é determinante no processo de selecção; pelo que, torna-se também responsabilidade do Estado assegurar este requisito básico ao jovem que ingressa no serviço militar de modo a que este serviço militar obrigatório não contribua para a sua exclusão futura do mercado de emprego. Há que conciliar as leis que a nossa Assembleia da República aprova com a dinâmica actual do nosso mercado de trabalho e da nossa sociedade em geral. É importante que o cidadão que cumpra com o seu dever de cidadania e preste o serviço militar obrigatório não se sinta vítima do sistema e portanto, impedido de usufruir do direito de poder concorrer em pé de igualdade com os outros cidadãos ao mercado de trabalho.

Portanto, o serviço militar obrigatório não deve limitar o acesso ao mercado de emprego e nem ser visto como uma punição mas sim um dever patriótico e servir para preparar condignamente o cidadão para a vida futura e que confira mais dignidade e orgulho de ser moçambicano. Os quartéis não devem ser locais para a permanência ociosa e mal nutrida de quem pode contribuir para a melhoria da sua dieta alimentar e para o desenvolvimento do país.

Haja vontade para transformar-se os quartéis em centros de produção de saber e de serviços para o Estado e para a sociedade em geral.