domingo, 27 de janeiro de 2013

OS ESTRAGOS PROVOCADOS PELAS CHUVAS NA CIDADE DE MAPUTO: QUE ILAÇÕES E RESPONSABILIDADES-Parte II


Na primeira parte desta reflexão, a qual foi publicada na edição passada, afirmei que era pertinente, à propósito dos estragos provocados pelas chuvas na Cidade de Maputo, discutir 5 pontos essenciais; tendo, naquela edição, apenas discutido o primeiro ponto. Assim na presente edição passarei a discutir o segundo ponto, ficando, o terceiro ao quinto ponto, por discutir nas próximas edições.

 

2.  Reabilitação e construção do prolongamento da Avenida Julius Nyerere.

 

A reabilitação deste troço levanta, nos munícipes, sérias dúvidas quanto à transparência do processo de apuramento da empresa que está a executar as obras bem como quanto à competência técnica da mesma para levar a bom termo a empreitada em curso. De acordo com o que está legislado acerca da contratação de empreitada de obras públicas (aprovado pelo Decreto 15/2010 de 24 de Maio) as empresas que se propõem a realizar empreitadas de obras públicas devem demonstrar experiência e competência técnica comprovada no tipo de obras a realizar (art. 24 do Regulamento aprovado pelo Decreto 15/2010 de 24 de Maio). Ora, olhando para o caso em concreto da empreitada relativa ao prolongamento da Julius Nyerere, facilmente se verifica que a empresa à qual foi adjudicada a obra é nova no mercado moçambicano e, salvo melhor opinião, nem sequer se conhecem obras de grande vulto realizadas por esta mesma empresa em nosso território ou na região da áfrica austral. Portanto, à bem da transparência é urgente que o Conselho Municipal da Cidade de Maputo dissipe as dúvidas que assombram a cabeça dos munícipes e que explique há quanto tempo esta empresa opera em nosso território, qual a experiência que tem para a realização deste tipo de empreitadas no nosso país ou na região, entre outros aspectos que contribuam para reforçar a confiança dos cidadãos acerca da credibilidade e competência técnica desta empresa visto que a obra que está a ser realizada é directa ou indirectamente financiada pelo cidadão.

 

As dúvidas acerca da empresa à qual foi adjudicada a obra levantam-se devido ao facto de, nas chuvas que ocorreram há semanas em Maputo e que teve como consequência o alagamento de diversas vias, nalgumas destas vias, particularmente as que se situam na zona de confluência com o prolongamento da Julius Nyerere, ter-se verificado um alagamento acima do normal, tendo, inclusive, a rua que cruza com o prolongamento da Julius Nyerere e desce para a Escola Portuguesa e para o Bazar do peixe, transformando-se num autêntico rio, coisa que nunca antes havia acontecido mesmo em situações de níveis de precipitação superiores aos níveis verificados naquele fatídico dia.

 

Por outro lado, os munícipes mais familiarizados com o troço acima referido, lembram-se que havia, anteriormente, uma vala de drenagem (por detrás da Escola Portuguesa e próximo ao Hospital Privado de Maputo) a qual, ao que parece, foi eliminada e não foi substituída por qualquer outro sistema de saneamento/ drenagem que possibilite o escoamento das águas que descem da Polana Caniço.

A meu ver, poderá haver uma relação directa entre os aspectos acima mencionados e o alagamento não habitual naquela zona, onde, como já se afirmou, a rua do Bazar do peixe se transformou num autêntico rio com direito a uma corrente forte capaz de arrastar os desavisados que se atreviam a atravessar, causando danos consideráveis às pessoas e bens bem como ao nosso Estado e Município.

Penso que enquanto cidadãos deveríamos exigir, formalmente, um esclarecimento e uma auditoria às obras e ao processo de selecção da empresa que ora realiza as obras para que se apurem responsabilidades e para que, caso não se verifique qualquer irregularidade tanto no processo de selecção como na execução da obra, se dissipem, uma vez por todas, as dúvidas e os murmúrios que se fazem ouvir um pouco por todo Maputo. Na minha opinião, a pior atitude seria a de deixar as coisas como estão, permitindo que as dúvidas e desconfianças prevaleçam no seio dos cidadãos. Não nos podemos esquecer o ditado que diz que quem cala consente.

Além do caso concreto acima referido, várias outras situações dramáticas foram vividas em diversas outras zonas da Cidade de Maputo. Mas, o que mais assusta aos cidadãos é que o nível de precipitação daquele dia não foi assim tão elevado, daí surgir a questão: O que acontecerá no dia em que o nível de precipitação for muito superior ao registado naquele dia? Não podemos nos esquecer que estamos, neste momento, em plena época chuvosa e com sinais de cheias na zona sul, o que nos revela que devemos esperar níveis de precipitação aumentados.

 

Por outro lado, sou da opinião que seria importante que o nosso Conselho Municipal viesse ao público explicar a razão do caos que se verificou naquele dia e aproveitasse para informar aos cidadãos quais são as medidas que estão a ser tomadas, com carácter de urgência, para que a situação vivida naquele dia não volte a repetir. É que, quem passou por apertos e situações dramáticas naquele dia, ao mínimo sinal de chuvas, pensa e repensa se deve ou não sair de casa, se deve ou não enfrentar as ruas de Maputo as quais, já se sabe, podem transformar-se em autênticos rios. Os cidadãos não podem continuar a viver sobre um medo permanente.

Paralelamente a este caso, há que chamar a atenção para o facto de o Município estar a tapar regularmente os buracos com cimento (marginal da Costa de Sol) não obstante ter ficado manifestamente demonstrado que esta técnica tem um tempo de duração muito curto. Se estivermos recordados, os mesmos buracos foram tapados em Novembro/Dezembro e em menos de um mês voltaram a reabrir e estão actualmente a ser novamente tapados com o mesmo material. Portanto, algo deve estar a ser feito de forma errada e é urgente que esta anomalia seja detectada e corrigida, pois, não podemos continuar a desperdiçar tempo e dinheiro dos nossos contribuintes desta forma. Como afirmou-se na edição passada, são os munícipes que, com os impostos que pagam, financiam a reparação das estradas, são os munícipes que enfrentam as longas filas e tráfego congestionado devido ao mau estado das vias e, por fim, são também os munícipes que têm de pagar a factura das reparações dos seus automóveis causados pelo mau estado da via. É o munícipe o maior prejudicado no meio disto tudo. 

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

OS ESTRAGOS PROVOCADOS PELAS RECENTES CHUVAS: QUE ILAÇÕES E RESPONSABILIDADES.


Parte I

É um facto que com frequência a nossa cidade é fustigada por chuvas e, por vezes, ventos fortes que causam luto nas famílias, danos materiais, patrimoniais e financeiros ao cidadão e ao próprio Estado. Também é verdade que com as mudanças climáticas teremos de nos habituar a conviver ciclicamente com este tipo de situações e estarmos preparados para enfrentá-las com o mínimo de prejuízo possível, portanto é necessário que o Estado, autoridades municipais bem como os cidadãos comecem a adoptar medidas que permitam prevenir o caos decorrentes das chuvas. Por certo que a maior responsabilidade na adopção de medidas que visem minorar os estragos decorrentes das chuvas cabe ao Estado e as entidades municipais, mas, alguma responsabilidade também cabe aos cidadãos. O nosso contributo, enquanto cidadãos, passa, particularmente, pela adopção de hábitos saudáveis e urbanos evitando todo o tipo de atitudes que afectem o sistema de drenagem existente na nossa cidade. Estes hábitos podem ser decisivos para a melhoria parcial do caos que se vive hoje. Se todos passarmos a acondicionar o lixo que produzimos e depositá-los correctamente nos contentores, se pararmos de atirar o lixo para o chão ou para as sarjetas, valas de drenagem, terrenos baldios, barreiras, entre outros locais inapropriados; já teremos dado um grande contributo que certamente terá um impacto positivo para o sistema de drenagem e para minorar os estragos provocados pelas chuvas.

Ao Estado e às entidades municipais cabe a restante responsabilidade, nomeadamente, melhoramento e manutenção do sistema de drenagem, melhoramento do sistema de recolha de lixo, adequação do sistema de drenagem e recolha de lixo ao incremento da população, etc... Além dos aspectos óbvios que contribuem para o défice do escoamento das águas na cidade de Maputo sou da opinião que a concessão desregrada de terrenos bem como a abertura desregrada de novas vias acabam por afectar negativamente o nosso sistema de escoamento das águas provenientes da chuva. A meu ver, não se pode falar de urbanização dissociada de saneamento. Em muitos países não se alcatroa nenhuma via sem que a mesma área disponha de um sistema de saneamento que proporcione o adequado escoamento das águas. Portanto, a construção/reabilitação e manutenção de um sistema de saneamento é fulcral para qualquer Cidade. O curso natural das águas pode ser alterado mas não eliminado. O facto de se erguer infra-estruturas de betão apenas pode alterar o curso das águas, portanto há que se encaminhar estas águas para o seu destino através de canais de escoamento capazes de suportar grandes fluxos de modo a que as águas não invadam as vias da cidade e provoquem danos avultados tanto às infra estruturas urbanas como também aos bens dos cidadãos.

Falando concretamente das últimas chuvas que caíram sobre a nossa cidade e dos estragos verificados, acho pertinente discutir 5 pontos em específico:

1.  Os fundos do PROMAPUTO investidos na reabilitação do sistema de saneamento e na reabilitação/construção e manutenção de estradas.

2.  Reabilitação e construção do prolongamento da Avenida Julius Nyerere

3.  Surgimento de novas construções sem obedecer ao plano urbanístico

4.  Limpeza e manutenção das valas de drenagem

5.  Deposito desordenado do lixo nas valas de drenagem e nos vários espaços da cidade.

Na presente edição será discutido apenas o primeiro ponto e os restantes quatro pontos serão discutidos na edição seguinte.

 

1. Os fundos do PROMAPUTO investidos na reabilitação do sistema de saneamento e na reabilitação/construção e manutenção de estradas.

A Cidade de Maputo beneficiou de um financiamento destinado à reabilitação do sistema de saneamento e à reabilitação/construção e manutenção de estradas. O valor do financiamento foi, supostamente, utilizado para os fins a que foram atribuídos. Acontece que não obstante o investimento feito, as últimas chuvas demonstraram claramente que o sistema de drenagem continua sem funcionar devidamente e, o mais grave, é que ninguém vem ao público explicar, com propriedade e de forma convincente, o que terá acontecido para que os milhões de dólares investidos tivessem sido jogados ao mar. É que nós os cidadãos bem como os nossos filhos e, eventualmente, os nossos netos, é que teremos de reembolsar o financiamento supostamente utilizado para melhorar o sistema de drenagem. Portanto temos todo o direito de exigir das entidades municipais que prestem contas e nos expliquem o porquê de o sistema de drenagem não estar a funcionar devidamente mesmo depois do investimento feito. Além do facto de ser o cidadão a ter que reembolsar o valor do financiamento, ao que parece, mal utilizado; o cidadão é duplamente prejudicado quando, tem de colocar as suas vidas bem como os seus bens em risco devido ao mau funcionamento do sistema de drenagem, com o cúmulo de, quando o caos se instala, não termos, sequer, a ajuda e orientação das entidades municipais; ficamos todos entregues a nós mesmos como se órfãos de Estado fossemos. Falo isso pelo facto de ter vivenciado e acompanhado o drama de muitos munícipes aquando das últimas chuvas, que nem sequer foram tão abundantes. Nas últimas chuvas, as estradas, principalmente da parte baixa da cidade, ficaram completamente alagadas, tendo, algumas delas, se transformado em autênticos rios. Algumas vias de acesso ficaram completamente intransitáveis e como consequência o tráfego tornou-se caótico, os peões passaram a circular com água até a cintura correndo riscos inimagináveis pois não conseguiam ver por que caminhos é que andavam e que objectos ou animais poderiam encontrar debaixo da água, ainda com o agravante de alguns cabos de electricidade terem caído e encontrarem-se submersos podendo fazer descargas eléctricas; os automóveis passaram a circular quase submersos, alguns dos quais não suportando a quantidade de água acabaram por avariar; os imóveis passaram a admitir água alguns dos quais até desabaram parcialmente. Este caos foi vivido pelos cidadãos, os quais não mereceram, sequer, uma ajuda ou orientação ou conforto por parte das autoridades. É que durante o fatídico dia, não se vislumbrou, sequer, um polícia municipal ou um agente da PRM que orientasse e informasse ao cidadão quais as vias que se encontravam interrompidas, quais as que se encontravam com engarrafamento, etc... Fomos deixados à nossa própria mercê como se fossemos órfãos do Estado e do nosso Município. Face a este abandono a que fomos votados quando mais precisávamos de uma orientação e conforto, questiono-me: Que destino é dado aos nossos impostos se na hora que mais precisamos das nossas autoridades somos votados ao abandono total e completo?

É que na hora de retirar uma parte dos nossos rendimentos as nossas autoridades fazem questão de nos lembrar que a eles cabe assegurar a nossa segurança e bem-estar, mas, na hora de prestar a segurança e bem-estar, as nossas autoridades simplesmente abandonam-nos à nossa própria sorte.

Por fim, importa ainda referir que, como se não bastasse termos de arcar com o reembolso do financiamento para a melhoria do sistema de drenagem, termos tido de suportar situações dramáticas que colocaram em risco as nossas vidas e bens, não termos tido qualquer tipo de conforto por parte das nossas autoridades; para coroar tudo isso, é ainda o cidadão quem tem de pagar a conta da reparação dos seus bens que ficaram danificados pelo mau funcionamento do sistema de drenagem das águas. É caso para questionar, até quando é que o cidadão deve suportar e tolerar que seja dupla, tripla ou triplamente prejudicado?   (Continua na próxima semana)

 

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A GREVE DOS MÉDICOS: PREVALECEU A RAZÃO E O BOM SENSO.


Na semana passada fiz uma reflexão sobre a greve dos médicos, a sua legalidade e a legitimidade de a actual liderança da Associação dos Médicos de Moçambique (AMM) levar avante a reivindicação dos médicos não obstante o mesmo exercer temporariamente funções no sector privado. Nesta reflexão afirmei que, na minha opinião, a greve não era ilegal e a liderança da AMM era legítima, bem como afirmei que não era novidade para ninguém que existia um descontentamento na função pública devido aos baixos salários praticados e a existência de diferenciação salarial entre funcionários da mesma categoria ou carreira profissional que exercem as respectivas funções em sectores diferentes dentro do Aparelho do Estado. Ainda nesta reflexão, afirmei que era importante que o Ministério da Saúde (MISAU) e a AMM estivessem predispostos a dialogar sem preconceitos e sem desconfianças mútuas cabendo ao Governo uma responsabilidade acrescida na gestão racional e estratégica deste assunto evitando, a todo o custo, que durante as negociações, a emoção se sobrepusesse à razão.

Felizmente hoje fomos todos colhidos pela boa nova de uma possível solução do diferendo através da celebração de um acordo entre as partes envolvidas. Ao que parece, a razão sobrepôs-se à emoção e ambas as partes privilegiaram o diálogo e o bom senso.

Se desde o início a razão tivesse imperado, certamente que este acordo teria sido assinado há mais tempo. De qualquer modo, há que parabenizar as partes envolvidas pelo acordo celebrado. Mais do que nunca ficou claro que vale sempre a pena lutar pelos direitos que nos assistem enquanto cidadãos utilizando as vias pacíficas e legais. Venceu a cidadania e venceu o Estado de Direito.

Aproveito esta ocasião para sugerir ao Governo a, através do Ministério das Finanças, elaborar e submeter à apreciação e aprovação da Assembleia da República, na próxima sessão parlamentar que inicia em Março, um orçamento rectificativo visando acomodar o impacto orçamental do acordo ora alcançado, particularmente o aumento salarial acordado.

Apelo ainda a Bancada Parlamentar da FRELIMO, proponente da revisão Constitucional que actualmente está em curso, para aproveitar a ocasião para incluir uma proposta de redução, para metade, do número de Deputados da Assembleia da República. Paralelamente, sou da opinião que dever-se-ia reduzir o número de Ministérios, o número de membros das Assembleias Provinciais e das Assembleias Municipais bem como extinguir-se o Governo da Cidade de Maputo. Acredito que com a redução e extinção acima proposta seria possível fazer-se face ao impacto orçamental decorrente do aumento salarial dos profissionais de saúde bem como estender este aumento para os funcionários e agentes do Estado no geral.

Com efeito, as poupanças a serem efectuadas a partir da diminuição das despesas públicas com salários e demais regalias dos deputados, Ministros, membros das Assembleias Provinciais, membros do Governo da Cidade de Maputo e membros das Assembleias Provinciais, permitiriam que o Governo reunisse parte dos recursos para realizar, a partir de 2015, aumentos substanciais nos salários dos funcionários e agentes do Estado em geral.

Por outro lado aproveito para reiterar o meu pensamento anteriormente veiculado que já é hora de pararmos de, sempre que qualquer problema se manifesta na nossa sociedade, alegarmos a existência de uma mão externa por detrás da manifestação do problema. Somos soberanos e temos capacidade de encarar os nossos problemas e buscar soluções para os mesmos. Todas as sociedades enfrentam problemas e há que saber encará-los como assuntos endógenos da sociedade e encontrar a solução para os mesmos.

A greve dos médicos mostrou a sociedade moçambicana que é possível reivindicarmos os nossos direitos de forma ordeira e pacífica e é possível, através do diálogo e cedências mútuas encontrarmos as soluções para os nossos problemas.

Aproveito para apelar aos médicos o retorno imediato aos seus postos de trabalho e que os próximos dias sejam de trabalho árduo para recuperar o tempo despendido na greve pois a saúde dos Moçambicanos depende do nosso pessoal de saúde.

 

 

 

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A GREVE DOS MÉDICOS: REFLEXÃO ACERCA DA SUA LEGALIDADE E LEGITIMIDADE.


Não é novidade para ninguém que existe um descontentamento na função pública, particularmente na carreira docente e nos profissionais de saúde, por sinal, os dois grupos mais representativos da função pública moçambicana, devido aos baixos salários praticados e a existência de diferenciação de salários entre funcionários da mesma categoria ou carreira profissional mas que exercem as respectivas funções em sectores diferentes dentro do Aparelho do Estado. Citemos por exemplo a diferença salarial entre um profissional da educação ou da saúde quando comparado com outro com a mesma categorial profissional mas que exerça as suas funções na Autoridade Tributaria de Moçambique, nos Tribunais, no Banco Central de Moçambique ou em outras instituições de soberania do nosso país. Ninguém está contra os salários praticados nessas instituições mas convenhamos que é urgente encontrar-se um mecanismo que permita uniformizar os salários dos funcionários públicos com categorias profissionais similares e elevar-se os salários dos funcionários em geral.

A recente greve dos médicos é parte deste descontentamento e cujo desfecho final poderá ou não contribuir para futuras greves de outros profissionais da função pública. Portanto, cabe ao governo gerir este assunto de forma racional e estratégica e evitar, a todo o custo, que durante as negociações, a emoção sobreponha-se á razão.

É importante que neste caso em apreço (MISAU e AMM) ambas as partes estejam predispostas a dialogar sem preconceitos e sem desconfianças mútuas cabendo ao governo uma responsabilidade acrescida quanto ao desfecho final deste caso. As alegações que têm sido avançadas acerca da existência de uma mão externa por detrás desta reivindicação dos médicos, ou a atribuição de adjectivos depreciativos a liderança da AMM em nada contribuí para um desfecho saudável do mesmo. Certamente que haverá erros de ambas as partes mas, o mais importante neste momento, não é buscar-se bodes expiatórios para se contornar a presente situação mas sim sentar-se à mesa e discutir-se com objectividade e isenção a situação buscando-se uma saída que acomode os interesses de ambas as partes a qual passa necessariamente por cedências mútuas. A seriedade, serenidade, calma e isenção que for dedicada na solução deste caso em particular certamente que terá um efeito reprodutor relativamente aos outros casos semelhantes que possam ocorrer no futuro visto que o problema apresentado pela AMM não é somente dos médicos mas sim de toda a função pública.

É um facto que houve, nos últimos anos, muitos avanços nas condições de trabalho e de vida dos funcionários públicos em geral e dos médicos em particular, daí falar-se que 80% das reivindicações dos médicos terem já sido satisfeitas mas, a principal reivindicação dos médicos e a reclamação silenciosa dos restantes funcionários públicos ainda está muito longe de ser satisfeita.

É verdade que o nosso Estado ainda não é capaz de produzir as receitas necessárias para atribuir aos seus funcionários salários condignos mas também é verdade que, havendo uma melhor planificação e reorientação das despesas públicas, é possível poupar-se os recursos existentes alocando-os na elevação dos salários actualmente pagos pelo Estado. Não se pode continuar a perpetuar-se, por mais tempo, o descontentamento e a desmotivação vivida na função pública sob o argumento de que se está a trabalhar para se inverter as coisas. É preciso acelerar-se o passo nesta caminhada visando conferir maior auto estima e mais motivação para o trabalho na função pública.

De nada valerá continuar a desperdiçar-se tempo e dinheiro á procura de uma mão externa, por detrás deste problema, quando o mesmo é somente nosso e não adianta procurar culpados fora das nossas fronteiras. Somos soberanos para entender o problema e juntos encontrar as melhores soluções. É conversando que as pessoas se entendem.

Da Legalidade desta greve.

Em algum momento, pareceu-me ter ouvido, de um porta-voz do Ministério da Saúde (MISAU), que a greve dos médicos era ilegal. Salvo melhor opinião, esta greve só seria ilegal se a Constituição da República de Moçambique em vigor a proibisse, o que não é o caso. O facto de haver uma lacuna na lei na é da responsabilidade do cidadão e sim do Estado. A Constituição da República é de carácter obrigatório e cabe tanto ao Presidente da República como aos Deputados da Assembleia da República garantirem o seu cumprimento integral. Portanto, mais do que nunca, cabe ao Estado garantir que os cidadãos tenham os seus direitos fundamentais assegurados e respeitados pelo Estado. A greve é um destes direitos fundamentais que assiste a todos os cidadãos indiscriminadamente e cabe á Assembleia da Republica legislar sobre a matéria o mais urgente possível.

Da Legitimidade do Presidente da Associação dos Médicos de Moçambique (AMM).

Há ainda quem questione acerca da legitimidade do Presidente da AMM em dirigir este processo pelo facto de o mesmo não ser funcionário público ou ser funcionário público em regime de licença registada. Pelo que se sabe, a AMM é uma associação dos médicos quer estes estejam no sector público ou no sector privado. Portanto, não vejo onde está o problema de a AMM ser dirigido por um associado que actue no sector privado e não no sector público. Afinal a AMM é a Associação dos Médicos da Função Publica ou é a Associação dos Médicos de Moçambique? Portanto se é a Associação dos Médicos de Moçambique, a preocupação do MISAU deve cingir-se às exigências dos médicos e não discutir acerca da legitimidade de quem lidera a AMM, pois quem actualmente lidera a referida Associação não só é membro associado da mesma como foi eleito pelos demais associados para os representar em nome da Associação.

Se até aqui as negociações entre o MISAU e a AMM decorreram sob a égide desta mesma liderança como é que hoje pode-se questionar a legitimidade desta mesma liderança? Afinal o MISAU andou este tempo todo a negociar com uma representação ilegal e ilegítima? Por favor, não deixemos que a emoção sobreponha-se à razão.

Apelo ao MISAU e à Associação dos Médicos de Moçambique para que voltem a sentar-se à mesa e juntos procurem ultrapassar as diferenças existentes sem preconceitos e sem tabus. E enquanto as negociações decorrem que a Associação dos Médicos de Moçambique inste aos seus associados a retomarem as actividades laborais o mais breve possível.

Apelo ao governo em geral que aproveite este caso para estudar e implementar, a breve trecho, medidas que visem harmonizar os salários na função pública e elevar-se os salários dos funcionários e agentes do Estado em geral.