segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O QUE ESTARÁ POR DETRÁS DA RECENTE RENÚNCIA DOS EDIS DE QUELIMANE, PEMBA E CUAMBA?





Por: Ismael Mussá.

Várias têm sido as interpretações dos cidadãos e dos media em geral quanto as reais motivações por detrás da renúncia dos Edis de Quelimane, Pemba e Cuamba. Houve quem insistentemente relacionasse a recente renúncia dos edis aos problemas de gestão; como também houve quem as relacionasse aos problemas de índole política, mais concretamente a fidelidade partidária ou ainda a fidelidade aos poderosos do partido FRELIMO nesses locais. Todavia, até aqui, ninguém foi capaz de apresentar uma versão que fundamente qualquer uma das causas acima descritas. Naturalmente que caberia ao partido FRELIMO ou a cada um dos Edis, individualmente, prestarem esta informação como forma de contribuírem para o esclarecimento público e minimizarem quaisquer interpretações erróneas sobre os seus casos. Era o mínimo que se podia esperar de cada um dos Edis pelo respeito aos seus eleitores e em respeito das suas próprias honras. Nesta senda de busca de explicações, comecei por analisar a primeira provável motivação (prestação de contas) e para tal recorri ao Relatório do Tribunal Administrativo e do Conselho de Ministros da Conta Geral do Estado referente ao ano 2009 (última conta auditada, analisada, discutida e aprovada pela Assembleia da República). Paralelamente, recorri também ao estudo realizado pelo Centro de Integridade Publica (CIP) sobre a referida conta e consultei também a Lei do Orçamento de Estado e Lei do SISTAFE entre ouros instrumentos legais.

De acordo com a legislação que rege o Orçamento de Estado, todas as instituições beneficiárias dos fundos do Estado são obrigadas a fornecer ao Ministério das Finanças, dentro dos prazos legalmente estabelecidos, toda a informação referente as receitas e as despesas realizadas como forma de assegurar a verificação antecipada da transparência e da legalidade no uso destes fundos bem como a capacidade de execução dos fundos por parte de determinada instituição do Estado ou por ela tutelada. Da consulta realizada a Conta Geral do Estado referente ao Exercício Económico de 2009 com a referência AR-VII/Inf/74/04.06.2010-Adenda 2, enviada pelo Conselho de Ministros á Assembleia da Republica, em 04/06/2010, constata-se que os Municípios de Mueda, Milange, Beira e Gorongosa não cumpriram com a Legislação Orçamental no tocante ao fornecimento da informação das despesas realizadas e das receitas, dentro dos prazos legalmente estipulados. No entanto, o Município de Mueda e Gorongosa beneficiam do atenuante por tratar-se de novo Município. Ainda de acordo com o referido relatório os Municípios de Marrupa, Ribaué, Alto Molocué, Ulongué, Gôndola, Massinga, Macia e Namaacha não declararam os saldos mas têm o atenuante visto tratar-se de novo Município e portanto, sem muita experiencia para lidar com este tipo de exigências da Lei mas o mesmo já não se aplica em relação aos Municípios de Milange e Beira visto tratar-se de Municípios mais consolidados.

Portanto, em nenhum momento se equaciona a eventualidade dos Municípios de Quelimane, Pemba e Cuamba não terem prestado contas. Antes pelo contrario, é nos fornecida toda a informação referente as despesas e as receitas realizadas por estes Municípios e dentro dos prazos legalmente estipulados.

Consultando o Estudo realizado pelo CIP e o relatório do Tribunal Administrativo constata-se também que ambos lamentam o facto de o Relatório da Conta Geral do Estado, pautar por não fornecer toda a informação referente as receitas e as despesas de determinadas instituições do Estado, dentro dos prazos legalmente previstos. Nesse contexto, o Tribunal Administrativo faz várias recomendações visando a correcção destas anomalias e o CIP fórmula severas críticas pelo incumprimento da Lei e levanta sérias dúvidas quanto a transparência da referida Conta Geral. No entanto, a Assembleia da Republica, com o voto favorável da Bancada da FRELIMO, aprovou a mesma conta não obstante também ter formulado a necessidade de se melhorar os relatórios futuros.

Chegados aqui, fica claro que tanto o Município de Quelimane bem como os Municípios de Pemba e de Cuamba, prestaram contas dentro dos prazos legalmente previstos e que a renúncia dos seus Edis não pode ter a ver com problemas relacionados com a prestação de contas. Então, surge-nos a interrogação: qual será de facto a verdadeira motivação que levou os referidos Edis a renunciarem ou que levou o partido a que pertencem a ’’forçar a renúncia’’ dos mesmos dos cargos que exerciam até bem pouco tempo? O que leva então, esses a renunciarem e não os que não prestarão contas a renunciarem? Pois, teria todo o sentido que fossem aqueles que não prestam contas a renunciarem e não aos que prestam contas. Onde reside a luta pela transparência e prestação de contas quando se premeiam os que não prestam contas e pune-se aqueles que prestam contas? Parece-me que algo está invertido e os cidadãos têm o direito constitucional de saberem a verdade.

Portanto, só resta-nos acreditar que a motivação por detrás destas renúncias não esteja relacionada com o facto de não prestarem contas e sim com problemas de fidelidade partidária ou de fidelidade aos poderosos do partido FRELIMO nesses locais. A ser verdade esta última versão, deverá ser motivo de preocupação de todos nós porque estaremos a contribuir com os nossos impostos para o perpetuar do culto de personalidade, da bajulação e da defesa de interesses contrários a vontade popular e a nação moçambicana. Para o bem da verdade e do interesse público, urge por conseguinte que tanto os Edis demissionários como o partido FRELIMO, esclareçam aos moçambicanos o que leva a que aqueles que se destaquem na prestação de contas sejam punidos e os ’’prevaricadores’’ sejam enaltecidos e ’’protegidos’’.

Para nós, importa, por outro lado, discutir as implicações que uma “renúncia” tem para os que acreditaram e apostaram nos respectivos edis. Estariam eles interessados em defraudar os seus eleitores abandonando-os no meio do mar e com os barcos quase ao fim da viagem? O que me parece é que os respectivos edis nem se quer apresentaram um argumento convincente para quem voluntariamente pretende abandonar o cargo. Uma renúncia pode ser voluntária ou, pode ser, forçada. A ser forçada as motivações da renúncia, pelas análises que fazemos, só podem ter contornos políticos e não necessariamente de índole administrativo. Tomando como exemplo o caso do Pio Matos, a sua “renúncia”, só pode ser o culminar de sucessivas crises de relacionamento interno entre as mais diferentes hierarquias do partido e do poder. Para nós, que estamos do lado de fora, só nos resta perguntar que interesses terão ditado as “renúncias” dos presidentes democraticamente eleitos? Que venha a verdade. O povo espera.


domingo, 23 de outubro de 2011

REFLECTINDO SOBRE O TÍTULO DE DOUTOR HONORIS CAUSA OUTORGADO À JANET MONDLANE

Hoje, para variar, abordarei a questão em epígrafe e convido a todos para uma reflexão pontual que julgo pertinente e oportuna nesta fase da nossa história como país e da Universidade Eduardo Mondlane em particular.
O título de Doutor Honoris Causa é concedido pelas Universidades á pessoas eminentes, que nem sempre são portadoras de um diploma universitário mas que se tenham destacado em determinada área quer seja nas artes, ciências, filosofia, letras, na promoção da paz, na promoção da reconciliação nacional, na promoção de causas humanitárias, entre outras; por sua boa reputação, virtude, mérito ou acções de serviço que transcendam famílias, pessoas ou instituições.
Historicamente um Doutor honoris causa recebe o mesmo tratamento e privilégios que aqueles que obtiveram um doutorado académico de forma convencional - a menos que no acto da outorga se especifique o contrário. Portanto, é um título que confere honra e dignidade a pessoa visada e que merece de todos nós o reconhecimento e o apreço dada a importância de que se reveste tamanho acto.
A Universidade Eduardo Mondlane (UEM) acabou de atribuir o título de Doutor Honoris Causa à Janet Mondlane, em Ciências de Educação, em reconhecimento à importância do seu contributo na educação da sociedade moçambicana antes, durante e depois da luta de libertação nacional, até esta parte.
Vêm-me á memória o facto de no inicio de 1999, o Conselho Universitário da Universidade Eduardo Mondlane (Órgão máximo deliberativo da UEM), do qual eu fazia parte, ter declarado o ano 1999, como sendo o ano Eduardo Mondlane da UEM, tendo o Reitor de então, Prof. Doutor Brazao Mazula, nomeado a 15 de Abril uma Comissão, através do Despacho Reitoral N°043/RT/99, encarregue de organizar as comemorações do ano Eduardo Mondlane da UEM, da qual também tive o privilegio e a honra de fazer parte juntamente com ilustres figuras da nossa universidade, com ênfase para o saudoso professor Fernando Ganhão. Portanto, penso que a atribuição deste título hoje seja o culminar de um esforço neste sentido que iniciou há mais de uma década na UEM e que mereceu hoje a atenção e a determinação do Professor Doutor Orlando Quilambo, actual Reitor, que decidiu conferir este título a Doutora Janet Mondlane, por mérito próprio e também em reconhecimento ao papel por ela desempenhado e pelo seu marido. Bem aja a Direcção da UEM por esta iniciativa e os meus parabéns a Doutora Janet Mondlane pela distinção e homenagem.
No entanto, julgo que o Conselho Universitário da UEM deveria continuar a reflectir sobre a pertinência de se atribuir o título de Doutor Honoris Causa ao Doutor Eduardo Chivambo Mondlane, patrono da nossa Universidade. A outorga do título de Doutor Honoris Causa, á título póstumo, poderia ser entregue ao seu filho, Eduardo Chivambo Mondlane Júnior ou a outros membros da sua família. Certamente que a UEM, ao agir deste modo estaria a dar um merecido e valioso reconhecimento a esta figura incontornável e emblemática da nossa história e da historia da UEM em particular. Fica aqui lançado o desafio.  
Na senda desta reflexão, gostaria também de sugerir que o Conselho Universitário da UEM reflicta também sobre a pertinência da UEM atribuir, nos próximos tempos, o título de Doutor Honoris Causa, em Ciência Política, á título póstumo, aos professores Fernando Ganhão (primeiro Reitor da UEM) e Aquino de Bragança (primeiro director e fundador do Centro de Estudos Africanos da UEM), ambos falecidos e que enquanto vivos estiveram ao serviço da UEM e contribuíram em grande medida para a expansão e consolidação desta universidade como um centro de saber por excelência na região e em África. Em jeito de conclusão, defendo que as instituições do ensino superior e a Universidade Eduardo Mondlane, em particular, deveriam reflectir profundamente sobre a pertinência de se homenagear também personalidades nacionais que têm dado, ao longo destes anos, muito do seu saber e do seu trabalho em áreas como a saúde, o ensino, a investigação, a extensão universitária, a promoção da cultura de paz, a promoção da reconciliação nacional, a promoção do sector público e privado e ao desenvolvimento nacional em geral. Penso que seria uma merecida forma de contribuirmos para a elevação e consolidação do nosso Estado de Direito sem contudo banalizarmos a outorga deste tipo de títulos e nem incorrermos em despesismos exagerados, particularmente nesta fase da contenção das despesas públicas.
É sempre bom partilhar ideias e reflexões e lançar novos desafios.





REFLECTINDO SOBRE AS VISITAS QUE A PRIMEIRA-DAMA DE MOCAMBIQUE TEM REALIZADO ÀS PROVINCIAS.

Hoje gostaria de partilhar convosco as minhas reflexões quanto às críticas que têm sido formuladas em relação às visitas que a Primeira-dama de Moçambique tem regularmente efectuado às províncias, nomeadamente: o facto de as mesmas assumirem um carácter meramente partidário, usurpar, por vezes, as funções de outras entidades do Estado, emanarem, em algumas vezes, instruções e orientações para os governantes locais, despenderem avultados recursos públicos numa altura de contenção das despesas públicas e duvidar-se do seu enquadramento legal no nosso ordenamento jurídico.
Primeiro gostaria de dizer que estas críticas são legítimas mas também dizer que a Primeira-dama é livre de realizar visitas por este país sempre que julgar conveniente e desde que enquadradas nas responsabilidades de cariz social e filantrópica que lhe cabem enquanto esposa do Presidente da República como é de praxe na maioria dos países no mundo.
O quê não deve, penso eu, é usar de forma abusiva recursos públicos para promover outro tipo de actividades, como sejam as actividades de carácter meramente partidário e as actividades que são da alçada ou da responsabilidade de outras entidades governativas e com mandatos conferidos por Lei.
Quanto ao enquadramento legal da figura de Primeira-dama, no nosso ordenamento jurídico, a julgar por aquilo que seja do meu conhecimento, penso que não existe nenhum enquadramento legal no nosso ordenamento jurídico, particularmente na função pública. Suponho que as actividades da Primeira-dama estejam enquadradas nas actividades de cariz social e filantrópico da presidência da Republica.
Já no tocante ao facto de, por vezes, a Primeira-dama, durante as visitas que realiza às províncias, deixar orientações para os governantes locais, definitivamente penso que ela não só não dispõe de legitimidade para o efeito como também os referidos actos carecem de eficácia jurídica e administrativa. Portanto, são actos nulos ou até mesmo inexistentes á luz da Lei N° 14/2009, de 17 de marco e do Decreto N° 62/2009, de 8 de Setembro, designadamente: o Estatuto Geral e o Regulamento dos Funcionários e Agentes do Estado, instrumentos aprovados pela Assembleia da Republica e pelo Conselho de Ministros respectivamente.
A Constituição da Republica no seu artigo 80, Capitulo I, Titulo III, sobre Direitos, Deveres e Liberdades Fundamentais, diz taxativamente: o cidadão tem o direito de não acatar ordens ilegais ou que ofendam os seus direitos, liberdades e garantias. Portanto, nenhum administrador ou funcionário público, nas províncias visitadas, deve ser obrigado a cumprir ordens não previstas na Lei.
Quero também concordar com as correntes de opinião que criticam o facto de estas visitas assumirem um carácter meramente partidário e não necessariamente de cariz social e filantrópico como deveria ser mas defendo no entanto, que mais importante ainda é a necessidade de conscientizarmos os cidadãos quanto aos seus direitos e deveres de modo a não os sujeitarmos a cumprirem ordens manifestamente ilegais e a saberem discernir correctamente as actividades que são de índole meramente partidárias e as que são de carácter institucional e do âmbito do Estado moçambicano.
Defendo portanto, a necessidade de conscientizarmos, cada vez mais, os cidadãos quanto a necessidade de denunciarem este tipo de situações e outras que atentem contra os seus direitos de cidadania e enquanto parlamentar, reafirmar a necessidade, com carácter de urgência, de, a Assembleia da Republica, clarificar o quanto antes, o papel que deve ser desempenhado pela Primeira-dama neste país de modo a evitar-se este tipo de ambiguidades e atropelos ao legalmente estabelecido por Lei.
Com relação aos gastos despendidos por estas deslocações e o papel efectivo da Primeira-dama, penso que a mesma deveria ter um papel meramente social e filantrópico e que as despesas poderiam até ser suportadas por uma fundação com o nome do seu esposo e complementadas por recursos doados pelo sector privado no âmbito da responsabilidade social das empresas. Por exemplo, parte das receitas dos jogos da sorte (lotaria e totobola) deveriam reverter para a Cruz Vermelha de Moçambique e também para o Gabinete da Primeira-dama de modo a evitar-se que as actividades desta instituição acarretem custos elevados ao erário público e particularmente nesta altura em que defendemos a contenção de gastos públicos e está instituição deve ser das primeiras a dar o seu exemplo.
Em jeito de conclusão, julgo que cabe a cada um de nós denunciarmos este tipo ilegalidades e apelarmos a quem de direito para se pôr cobro a estas situações. Acredito que com um pouco mais de pressão, particularmente dos media e da sociedade civil em geral, este tipo de práticas e outras, que ocorrem no dia-a-dia, serão definitivamente banidas do nosso país.
Definitivamente, devemos ser mais contundentes e constantes na acção de denunciar e exigir o respeito pelas leis e pela Constituição da Republica.
Vamos continuar a reflectir em prol de uma cidadania mais actuante e responsável.


sexta-feira, 21 de outubro de 2011

POR VEZES O RECUO PODE SIGNIFICAR UM AVANÇO: O CASO DA REFORMA CURRICULAR NA UEM.

”A direcção da Universidade Eduardo Mondlane decidiu, semana passada, que se deve retornar, a partir do próximo ano, ao anterior currículo de quatro anos de formação para a obtenção de licenciatura em diversas áreas do saber, e sete anos para medicina.” In jornal o Pais do dia 17/10/2011.
Independentemente de todas as críticas que possamos formular à actual Direcção da UEM, por ter sido, de certa maneira, cúmplice na adopção do Currículo ora chumbado pelo Conselho Universitário, penso que esta decisão do elenco dirigido pelo Professor Doutor Orlando Quilambo, foi acertada. É meu entendimento que não vale a pena perpetuar-se um erro somente por ter sido parte da equipa que cometeu esse mesmo erro, mais vale tarde do que nunca. Portanto, antes de tudo gostaria de saudar a Direcção da UEM por ter reconhecido que estava errada e ter agido no sentido de se reparar o erro com todas as implicações que daí possam advir. Se estivermos recordados esta é a segunda decisão corajosa que a actual direcção da UEM tomou neste ano visando corrigir decisões precipitadas e pouco reflectidas tomadas no reinado do Professor Doutor Filipe Couto. Refiro-me à decisão de transferir a Faculdade de Agronomia do Sabié para o Campus da UEM na cidade de Maputo, corrigindo desse modo uma decisão pouco ponderada e até certo ponto populista e não realista e que sujeitava os estudantes a viverem em tendas e a estudarem sem o acesso indispensável à bibliotecas e laboratórios, requisitos fundamentais para uma formação com qualidade. Se estivermos lembrados em 2008, a UEM, introduziu um novo currículo sem os consensos internos necessários e sem a concórdia das ordens profissionais, proporcionando acesos debates televisivos e radiofónicos e muita contestação e quase que uma greve silenciosa na Academia. Era e continua a ser o entendimento de quase todos os contestatários desse Currículo que os estudantes já vêm com deficiências do ensino primário e secundário e as actuais condições de trabalho no ensino superior estavam e continuam a estar muito aquém das condições requeridas por este novo modelo de ensino, citava-se o exemplo do número de estudantes por sala de aulas, o rácio docente/estudante e as condições em termos de equipamentos e de outro material didáctico. A redução do número de anos de formação, nas condições actuais, ao invés de ser uma vantagem poderia transformar-se numa tremenda desvantagem. No entendimento destas pessoas é provável que um dia possamos aderir a esse modelo mas não de forma precipitada e populista como se pretendeu fazer pondo em risco a pouca qualidade que ainda sobra do nosso ensino superior. Penso que a reforma é necessária e deve abranger de forma conjugada ou articulada os níveis primário, secundário e superior e teremos de saber ouvir todos os interlocutores no processo e assumir cada passo no momento apropriado e nada de precipitações e populismo barato para mostrar que se está a formar quadros quando provavelmente está-se a amputar o futuro do nosso país. A reforma curricular deve ser um processo dinâmico, inclusivo, abrangente e contínuo e deve ter um prazo mas não deve ser feito as pressas como se pretendeu. Penso que o Professor Doutor Filipe Couto até possa ter razão mas está adiantado no tempo, talvez até tenha ’’acelerado demais no passo’’ em resposta ao apelo do Chefe de Estado sem tomar em consideração a realidade do nosso ensino no geral e as condições que o país dispõe ou pode dispor neste momento. É preciso dar tempo ao tempo sem populismo e ser-se mais realista. Outro aspecto de particular gravidade relaciona-se com o facto de a UEM ter decidido introduzir, em 2008, o novo Currículo sem a necessária cobertura legal. Nessa altura participei em vários debates televisivos e critiquei, com firmeza, as mudanças que a UEM pretendia introduzir antes de se efectuar a revisão pontual da Lei do Ensino superior de modo a conformar a reforma curricular com a Legislação especifica. Após aturados debates e o elevar das vozes contestatárias, o Conselho de Ministros acabou por submeter, em 2009, a proposta de revisão da Lei do Ensino Superior que conferiu a cobertura legal a uma decisão assumida ilegalmente pela UEM em 2008. Mesmo assim, este processo de revisão da legislação do ensino superior não foi transparente e o Presidente da República acabou por promulgar a referida alteração da Lei sem que tivessem sido observados todos os procedimentos legislativos na Assembleia da Republica (matéria que poderei abordar numa outra ocasião se necessário). Neste contexto, julgo oportuno recomendar a actual Direcção da UEM, para que interceda, junto do Ministro da Educação, no sentido deste, através do Conselho de Ministros, submeter à Assembleia da República, com carácter de urgência, a proposta de revisão da actual Lei de Ensino Superior de modo a conformar a recente decisão do Conselho Universitário da UEM com a legislação do Ensino Superior, evitando, deste modo, a repetição da ilegalidade cometida em 2008 pela UEM e pelo Governo e permitir que possamos iniciar o próximo ano lectivo com o novo currículo, ora readoptado. Ainda na senda deste episódio penso que é também chegada a altura de se começar a exigir responsabilidades pelos erros que se cometem no exercício de cargos públicos, particularmente erros desta natureza que acarretam elevados prejuízos para o já pauperizado Estado Moçambicano e para o cidadão deste país.
Portanto, o caminho é para frente e que este recuo estratégico e forçado sirva de lição e não desencoraje, no entanto, a pertinência e a oportunidade de se reflectir de forma profunda e inclusiva sobre os problemas que afectam a qualidade do nosso ensino no geral de modo a produzir-se as reformas necessárias. Por fim dizer: bem-haja o Conselho Universitário da UEM pela sua sensatez e humildade em saber reconhecer o erro e tomar a decisão mais apropriada para a reparação imediata do erro cometido.