sexta-feira, 21 de outubro de 2011

POR VEZES O RECUO PODE SIGNIFICAR UM AVANÇO: O CASO DA REFORMA CURRICULAR NA UEM.

”A direcção da Universidade Eduardo Mondlane decidiu, semana passada, que se deve retornar, a partir do próximo ano, ao anterior currículo de quatro anos de formação para a obtenção de licenciatura em diversas áreas do saber, e sete anos para medicina.” In jornal o Pais do dia 17/10/2011.
Independentemente de todas as críticas que possamos formular à actual Direcção da UEM, por ter sido, de certa maneira, cúmplice na adopção do Currículo ora chumbado pelo Conselho Universitário, penso que esta decisão do elenco dirigido pelo Professor Doutor Orlando Quilambo, foi acertada. É meu entendimento que não vale a pena perpetuar-se um erro somente por ter sido parte da equipa que cometeu esse mesmo erro, mais vale tarde do que nunca. Portanto, antes de tudo gostaria de saudar a Direcção da UEM por ter reconhecido que estava errada e ter agido no sentido de se reparar o erro com todas as implicações que daí possam advir. Se estivermos recordados esta é a segunda decisão corajosa que a actual direcção da UEM tomou neste ano visando corrigir decisões precipitadas e pouco reflectidas tomadas no reinado do Professor Doutor Filipe Couto. Refiro-me à decisão de transferir a Faculdade de Agronomia do Sabié para o Campus da UEM na cidade de Maputo, corrigindo desse modo uma decisão pouco ponderada e até certo ponto populista e não realista e que sujeitava os estudantes a viverem em tendas e a estudarem sem o acesso indispensável à bibliotecas e laboratórios, requisitos fundamentais para uma formação com qualidade. Se estivermos lembrados em 2008, a UEM, introduziu um novo currículo sem os consensos internos necessários e sem a concórdia das ordens profissionais, proporcionando acesos debates televisivos e radiofónicos e muita contestação e quase que uma greve silenciosa na Academia. Era e continua a ser o entendimento de quase todos os contestatários desse Currículo que os estudantes já vêm com deficiências do ensino primário e secundário e as actuais condições de trabalho no ensino superior estavam e continuam a estar muito aquém das condições requeridas por este novo modelo de ensino, citava-se o exemplo do número de estudantes por sala de aulas, o rácio docente/estudante e as condições em termos de equipamentos e de outro material didáctico. A redução do número de anos de formação, nas condições actuais, ao invés de ser uma vantagem poderia transformar-se numa tremenda desvantagem. No entendimento destas pessoas é provável que um dia possamos aderir a esse modelo mas não de forma precipitada e populista como se pretendeu fazer pondo em risco a pouca qualidade que ainda sobra do nosso ensino superior. Penso que a reforma é necessária e deve abranger de forma conjugada ou articulada os níveis primário, secundário e superior e teremos de saber ouvir todos os interlocutores no processo e assumir cada passo no momento apropriado e nada de precipitações e populismo barato para mostrar que se está a formar quadros quando provavelmente está-se a amputar o futuro do nosso país. A reforma curricular deve ser um processo dinâmico, inclusivo, abrangente e contínuo e deve ter um prazo mas não deve ser feito as pressas como se pretendeu. Penso que o Professor Doutor Filipe Couto até possa ter razão mas está adiantado no tempo, talvez até tenha ’’acelerado demais no passo’’ em resposta ao apelo do Chefe de Estado sem tomar em consideração a realidade do nosso ensino no geral e as condições que o país dispõe ou pode dispor neste momento. É preciso dar tempo ao tempo sem populismo e ser-se mais realista. Outro aspecto de particular gravidade relaciona-se com o facto de a UEM ter decidido introduzir, em 2008, o novo Currículo sem a necessária cobertura legal. Nessa altura participei em vários debates televisivos e critiquei, com firmeza, as mudanças que a UEM pretendia introduzir antes de se efectuar a revisão pontual da Lei do Ensino superior de modo a conformar a reforma curricular com a Legislação especifica. Após aturados debates e o elevar das vozes contestatárias, o Conselho de Ministros acabou por submeter, em 2009, a proposta de revisão da Lei do Ensino Superior que conferiu a cobertura legal a uma decisão assumida ilegalmente pela UEM em 2008. Mesmo assim, este processo de revisão da legislação do ensino superior não foi transparente e o Presidente da República acabou por promulgar a referida alteração da Lei sem que tivessem sido observados todos os procedimentos legislativos na Assembleia da Republica (matéria que poderei abordar numa outra ocasião se necessário). Neste contexto, julgo oportuno recomendar a actual Direcção da UEM, para que interceda, junto do Ministro da Educação, no sentido deste, através do Conselho de Ministros, submeter à Assembleia da República, com carácter de urgência, a proposta de revisão da actual Lei de Ensino Superior de modo a conformar a recente decisão do Conselho Universitário da UEM com a legislação do Ensino Superior, evitando, deste modo, a repetição da ilegalidade cometida em 2008 pela UEM e pelo Governo e permitir que possamos iniciar o próximo ano lectivo com o novo currículo, ora readoptado. Ainda na senda deste episódio penso que é também chegada a altura de se começar a exigir responsabilidades pelos erros que se cometem no exercício de cargos públicos, particularmente erros desta natureza que acarretam elevados prejuízos para o já pauperizado Estado Moçambicano e para o cidadão deste país.
Portanto, o caminho é para frente e que este recuo estratégico e forçado sirva de lição e não desencoraje, no entanto, a pertinência e a oportunidade de se reflectir de forma profunda e inclusiva sobre os problemas que afectam a qualidade do nosso ensino no geral de modo a produzir-se as reformas necessárias. Por fim dizer: bem-haja o Conselho Universitário da UEM pela sua sensatez e humildade em saber reconhecer o erro e tomar a decisão mais apropriada para a reparação imediata do erro cometido.


Sem comentários:

Enviar um comentário