quarta-feira, 10 de outubro de 2012

SERÁ QUE O SEGREDO DA DESPARTIDARIZAÇÃO DO ESTADO NÃO ESTÁ NA SUA EXCESSIVA PARTIDARIZAÇÀO? É que a bebida ingerida em excesso embebeda.


Partilho hoje convosco um artigo de opinião que publiquei em 2007 num dos jornais da praça mas que dada a sua actualidade e pertinência, julguei oportuno voltar a publicar neste espaço de opinião. Trata-se da minha percepção sobre a partidarização do Estado em Moçambique e dizer antes de mais que considero válido e importante tudo que já se escreveu sobre esta temática.

Refiro-me aqui as denúncias quase diárias, na nossa imprensa, sobre a proliferação das células do partido no poder em todas as instituições do Estado, salvo raras excepções, sobre os panfletos de propaganda eleitoral afixado nos gabinetes dos administradores distritais e outros dirigentes, a partidarização dos eventos de Estado, etc.

Portanto, em Moçambique, ninguém comprometido com a construção de uma cidadania inclusiva e participativa e com o Estado de Direito pode negar esta triste realidade.

Todos nós conhecemos inúmeros exemplos de funcionários públicos que enquanto não assumam uma posição político-partidária contrária ao poder político instituído são considerados quadros capazes e necessários ao processo de desenvolvimento, mas, assim que estes funcionários assumem uma posição pública à favor de algum partido da oposição ou não comunguem das posições oficiais ou ainda não aceitem “por livre iniciativa” aderir ao partido no poder, deixam de ser quadros úteis e necessários e passam a ser automaticamente quadros dispensáveis mesmo que continuem no Estado e beneficiem das promoções e progressões na carreira mas não passam disso.

Todavia, mesmo diante de todos os indicadores que apontam para o regresso da intolerância e dos dogmas totalitários, prefiro ser optimista e acreditar que nenhum tirano nos irá escravizar e que tudo que tem começo tem fim.

Uma das razões que me leva a pensar deste modo relaciona-se com o facto de uma parte da elite intelectual e até mesmo de uma certa ala do partido no poder, estar a enfrentar dificuldades em conviver com toda esta situação por mais tempo. É que assim está-se a prejudicar a economia do país e a torná-la ineficiente pois passamos a viver a situação de termos recursos subaproveitados o que não se compadece com as inúmeras necessidades da nossa sociedade.

Uma razão mais forte do meu optimismo relaciona-se com o facto de eu acreditar que o segredo da despartidarização do Estado está exactamente nesta excessiva partidarização.

A bebida ingerida em excesso embebeda. O início da queda da maioria dos regimes totalitários no mundo foi geralmente acompanhado pelo endurecimento precipitado nas últimas fases desses regimes.

Determinados governantes deste país ao privilegiarem a confiança politica em detrimento da competência técnica dos funcionários do Estado estão a criar as premissas para que o péssimo funcionamento dos Serviços públicos não só prejudique ao público em geral como também as próprias elites governativas e até ao próprio Chefe de Estado. Quem não se lembra do embaraço que o nosso Chefe de Estado teve diante da avalanche das inconstitucionalidades no seu primeiro mandato, incluindo até do próprio Órgão do Estado encarregue de gerir e profissionalizar a função pública.

Quero acreditar que o Chefe de Estado tarde ou cedo chegará á conclusão que ao se promover o culto a personalidade e a fidelidade partidária ao invés da competência técnica e a profissionalização do Estado, não lhe levará a bom porto.

Os mesmos “camaradas” que aconselharam mal o Presidente Chissano e hoje se armam em comandantes mores do “combate ao espírito do deixa andar” são os mesmos que hoje “aconselham” ao actual Presidente da Republica a pactuar com a incompetência em detrimento da excelência e da qualidade e no próximo mandato serão os mesmos a criticarem o actual PR por ter cometido erros absurdos enquanto Presidente da República.

São estes “messias” que levaram o actual Presidente da República a abraçar de forma pouco convincente a aposta na produção da Jartropha, são os mesmos que produziram os despachos inconstitucionais, são os mesmos que mandataram as entidades publicas a adoptarem slogans partidários mesmo conscientes de que estamos num Estado de Direito, são os mesmos que introduziram um novo currículo no ensino superior sem tomar em consideração a realidade actual do nosso ensino primário e secundário e as condições de trabalho nas universidades, são os mesmos que levaram o governo a anunciar a cesta básica para tempos depois voltar atrás com a decisão tomada, são os mesmo que planificaram as inspecções obrigatórias dos carros e depois não sabem dizer quando será obrigatório, são os mesmos que disseram que os cartões dos telemóveis deviam ser registados obrigatoriamente e hoje já não sabem dizer a partir de quando será obrigatório, são os mesmos que “planificaram” a aplicação dos “vulgo” sete milhões nos distritos e que hoje reconhecem, nos vários estudos, terem errado, mas não dizem onde erraram, etc, etc....

 

Penso que ninguém em sã consciência e muito menos o país pode dar-se ao luxo de dispensar talentos e capacidades por meros caprichos de confiança ou fidelidade política.

 

Por isso, espero que o nosso Chefe de Estado dedique todas as suas energias na defesa, promoção e consolidação da unidade nacional, dos direitos humanos, da democracia e do bem-estar do povo moçambicano e faça justiça a todos os cidadãos (n° 2 do artigo 150 da Constituição da Republica de Moçambique) e salve deste modo a nossa pátria destes falso messias.

 

Mas, mais do que esperar que os efeitos da partidarização possam eles próprios forçar a despartidarização, julgo que todos nós não somos poucos para juntos fazermos algo concertado e viável para que este pesadelo passe á história de uma época menos boa do nosso país.

 

Só assim é que poderemos produzir a riqueza nacional, reparti-la igualmente ou equitativamente entre os cidadãos e não permitirmos eternamente que a retórica continue a substituir, na maior parte das vezes, as acções.

 

Pelo que apelo a todos e muito em particular aos intelectuais deste nosso Moçambique para que se libertem e passem a denunciar de viva voz todo este macabro plano que visa perpetuar o subdesenvolvimento e a dependência externa do nosso País.

A geração do 25 de Setembro cumpriu com a sua nobre missão de libertar a terra e os homens do jugo colonial, cabe agora a nossa geração contribuir de forma determinante para a libertação das mentes dos homens e mulheres deste maravilhoso país.

Penso que é e deve ser um imperativo nacional a construção de uma cidadania inclusiva e participativa, capaz de ser ouvida e respeitada, através do exercício pleno dos direitos e liberdades garantidos pela Constituição da República de Moçambique.

 

 

Sem comentários:

Enviar um comentário