Partilho hoje convosco um artigo de opinião que publiquei
em 2007 num dos jornais da praça mas que dada a sua actualidade e pertinência,
julguei oportuno voltar a publicar neste espaço de opinião. Trata-se da minha
percepção sobre a partidarização do Estado em Moçambique e dizer antes de mais
que considero válido e importante tudo que já se escreveu sobre esta temática.
Refiro-me aqui as denúncias quase diárias, na nossa
imprensa, sobre a proliferação das células do partido no poder em todas as
instituições do Estado, salvo raras excepções, sobre os panfletos de propaganda
eleitoral afixado nos gabinetes dos administradores distritais e outros
dirigentes, a partidarização dos eventos de Estado, etc.
Portanto, em Moçambique, ninguém comprometido com a
construção de uma cidadania inclusiva e participativa e com o Estado de Direito
pode negar esta triste realidade.
Todos nós conhecemos inúmeros exemplos de funcionários públicos
que enquanto não assumam uma posição político-partidária contrária ao poder
político instituído são considerados quadros capazes e necessários ao processo
de desenvolvimento, mas, assim que estes funcionários assumem uma posição
pública à favor de algum partido da oposição ou não comunguem das posições
oficiais ou ainda não aceitem “por livre iniciativa” aderir ao partido no poder,
deixam de ser quadros úteis e necessários e passam a ser automaticamente
quadros dispensáveis mesmo que continuem no Estado e beneficiem das promoções e
progressões na carreira mas não passam disso.
Todavia, mesmo diante de todos os indicadores que apontam
para o regresso da intolerância e dos dogmas totalitários, prefiro ser
optimista e acreditar que nenhum tirano nos irá escravizar e que tudo que tem
começo tem fim.
Uma das razões que me leva a pensar deste modo
relaciona-se com o facto de uma parte da elite intelectual e até mesmo de uma
certa ala do partido no poder, estar a enfrentar dificuldades em conviver com
toda esta situação por mais tempo. É que assim está-se a prejudicar a economia
do país e a torná-la ineficiente pois passamos a viver a situação de termos
recursos subaproveitados o que não se compadece com as inúmeras necessidades da
nossa sociedade.
Uma razão mais forte do meu optimismo relaciona-se com o
facto de eu acreditar que o segredo da despartidarização do Estado está
exactamente nesta excessiva partidarização.
A bebida ingerida em excesso embebeda. O início da queda
da maioria dos regimes totalitários no mundo foi geralmente acompanhado pelo
endurecimento precipitado nas últimas fases desses regimes.
Determinados governantes deste país ao privilegiarem a
confiança politica em detrimento da competência técnica dos funcionários do
Estado estão a criar as premissas para que o péssimo funcionamento dos Serviços
públicos não só prejudique ao público em geral como também as próprias elites
governativas e até ao próprio Chefe de Estado. Quem não se lembra do embaraço
que o nosso Chefe de Estado teve diante da avalanche das inconstitucionalidades
no seu primeiro mandato, incluindo até do próprio Órgão do Estado encarregue de
gerir e profissionalizar a função pública.
Quero acreditar que o Chefe de Estado tarde ou cedo
chegará á conclusão que ao se promover o culto a personalidade e a fidelidade
partidária ao invés da competência técnica e a profissionalização do Estado,
não lhe levará a bom porto.
Os mesmos “camaradas” que aconselharam mal o Presidente
Chissano e hoje se armam em comandantes mores do “combate ao espírito do deixa
andar” são os mesmos que hoje “aconselham” ao actual Presidente da Republica a
pactuar com a incompetência em detrimento da excelência e da qualidade e no
próximo mandato serão os mesmos a criticarem o actual PR por ter cometido erros
absurdos enquanto Presidente da República.
São estes “messias” que levaram o actual Presidente da República
a abraçar de forma pouco convincente a aposta na produção da Jartropha, são os
mesmos que produziram os despachos inconstitucionais, são os mesmos que
mandataram as entidades publicas a adoptarem slogans partidários mesmo
conscientes de que estamos num Estado de Direito, são os mesmos que
introduziram um novo currículo no ensino superior sem tomar em consideração a
realidade actual do nosso ensino primário e secundário e as condições de
trabalho nas universidades, são os mesmos que levaram o governo a anunciar a
cesta básica para tempos depois voltar atrás com a decisão tomada, são os mesmo
que planificaram as inspecções obrigatórias dos carros e depois não sabem dizer
quando será obrigatório, são os mesmos que disseram que os cartões dos
telemóveis deviam ser registados obrigatoriamente e hoje já não sabem dizer a
partir de quando será obrigatório, são os mesmos que “planificaram” a aplicação
dos “vulgo” sete milhões nos distritos e que hoje reconhecem, nos vários
estudos, terem errado, mas não dizem onde erraram, etc, etc....
Penso que ninguém em sã consciência e muito menos o país
pode dar-se ao luxo de dispensar talentos e capacidades por meros caprichos de
confiança ou fidelidade política.
Por isso, espero que o nosso Chefe de Estado dedique todas
as suas energias na defesa, promoção e consolidação da unidade nacional, dos
direitos humanos, da democracia e do bem-estar do povo moçambicano e faça
justiça a todos os cidadãos (n° 2 do artigo 150 da Constituição da Republica de
Moçambique) e salve deste modo a nossa pátria destes falso messias.
Mas, mais do que esperar que os efeitos da partidarização
possam eles próprios forçar a despartidarização, julgo que todos nós não somos
poucos para juntos fazermos algo concertado e viável para que este pesadelo
passe á história de uma época menos boa do nosso país.
Só assim é que poderemos produzir a riqueza nacional,
reparti-la igualmente ou equitativamente entre os cidadãos e não permitirmos
eternamente que a retórica continue a substituir, na maior parte das vezes, as
acções.
Pelo que apelo a todos e muito em particular aos
intelectuais deste nosso Moçambique para que se libertem e passem a denunciar
de viva voz todo este macabro plano que visa perpetuar o subdesenvolvimento e a
dependência externa do nosso País.
A geração do 25 de Setembro cumpriu com a sua nobre
missão de libertar a terra e os homens do jugo colonial, cabe agora a nossa
geração contribuir de forma determinante para a libertação das mentes dos
homens e mulheres deste maravilhoso país.
Penso que é e deve ser um imperativo nacional a
construção de uma cidadania inclusiva e participativa, capaz de ser ouvida e
respeitada, através do exercício pleno dos direitos e liberdades garantidos
pela Constituição da República de Moçambique.
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