Celebramos
este ano o 37 ° ano da independência nacional e penso que vale a pena debruçarmo-nos
um pouco mais sobre o acesso e particularmente sobre a qualidade dos serviços de
saúde prestados ao cidadão e aos desafios que se apresentam a este sector nesta
fase e no futuro imediato.
Fazendo
um balanço justo e merecido não restam dúvidas de que a nacionalização da saúde
e da educação e as políticas governamentais adoptadas para estes sectores no período
imediatamente após independência foram as mais adequadas ao momento e
transformaram tanto a saúde como a educação num direito de todo o cidadão e contribuíram
decisivamente para a melhoria do acesso aos cuidados primários de saúde e da
escolaridade das nossas populações, quer urbanas como rurais, quando comparadas
com a situação vivida no período colonial. Hoje a nossa maior reivindicação,
enquanto cidadãos, não é propriamente quanto a quantidade ou a expansão destes
mesmos serviços mas é quanto a qualidade e a diversidade dos serviços prestados
nestas duas áreas. Por exemplo, é um facto que não dispomos ainda de serviços de
saúde em todas as localidades do nosso país mas é também verdade que o Serviço Nacional
de Saúde funciona presentemente em todas as sedes distritais e em muitas
localidades e até mesmo em quase todos os bairros dos centros urbanos e que, não
obstante a fraca qualidade e a fraca diversidade dos serviços prestados, houve
um grande salto quando comparado ao período imediatamente após independência. Se
ontem a reivindicação era por causa da ausência dos serviços de saúde na maior
parte do nosso território, hoje as reclamações resumem-se essencialmente na
fraca qualidade dos serviços prestados, na carência de pessoal técnico e qualificado,
na escassez ou insuficiência dos equipamentos de diagnóstico e tratamento médico,
na constante ruptura de stock de medicamentos, nas enchentes e no mau
atendimento que ainda se verifica em muitas unidades sanitárias e bem como nas
dificuldades de acesso às unidades sanitárias, particularmente na época chuvosa
isto nos meios rurais e nos bairros suburbanos dada a precariedade das vias de
acesso e a limitação dos meios de transportes disponíveis nesses locais.
Portanto,
estes e outros problemas persistem e perpetuam o sofrimento dos cidadãos e
requerem de todos nós o empenho na busca de soluções mais ousadas visando ultrapassar
estes obstáculos e oferecer mais e melhor saúde aos cidadãos com maior
brevidade possível.
Nos anos
imediatamente pós independência e no período logo após o Acordo Geral de Paz a
população facilmente compreendia e tolerava as justificações quanto aos atrasos
na implementação de políticas e programas sociais mais abrangentes e de
qualidade. Hoje, mercê do acesso universal à educação e aos ventos da democratização
da nossa sociedade é mais complicado encontrar justificações plausíveis e aceitáveis.
A consciência política eleva-se a cada dia que passa e portanto, urge
encontrar-se, a breve trecho, soluções sustentáveis e convincentes para os
variados desafios que se impõem. Ainda bem que assim é e espero que a elevação
da consciência dos direitos de cidadania seja contínua para que o cumprimento
do contrato social seja integral e efectivo.
É
exactamente pensando nisso que julguei pertinente dar o meu contributo propondo,
numa primeira fase, a transformação dos actuais Hospitais Centrais de Maputo,
Beira e Nampula, em Hospitais Universitários adstritos as Faculdades de
Medicinas das Universidades Eduardo Mondlane, UniZambeze e UniLurio de modo a
proporcionar estágios curriculares e acima de tudo a condução de pesquisas
visando a melhoria dos serviços prestados pelos outros hospitais e Centros de Saúde
nas regiões respectivas. É um facto de que neste momento estes três hospitais
oferecem estágios mas o que proponho é que sejam transformado em hospitais de referência
e mais dedicados às experienciais e às inovações médicas. Nessas cidades deveriam
ser construídos outros hospitais em substituição destes. Os docentes/ médicos adstritos
a estas Faculdades e Hospitais Universitários dedicar-se-iam mais à docência e à
investigação do que propriamente à prestarem serviços nos outros hospitais. Estes
hospitais universitários poderiam abrir programas dedicados especificamente ao
estudo das nossas plantas medicinais e tradicionais através do intercâmbio com
os médicos tradicionais e outros intervenientes nesse campo. Países como a China,
a Índia e o Brasil implementaram, nas últimas décadas, programas interessantes
na área da medicina verde que poderiam ser ajustados ao nosso contexto com múltiplos
benefícios para os cidadãos mais carenciados que passariam a dispor de mais opções
em medicamentos e de medicamentos a custos mais acessíveis do que os importados
ou produzidos de forma convencional. É urgente despirmo-nos de alguns
preconceitos com relação a medicina verde ou tradicional mas também acautelarmo-nos
quanto aos perigos e danos graves que o seu uso desregrado pode causar à saúde
humana. Defendo também que, em estreita articulação com estes hospitais
universitários poderiam ser instaladas fábricas de medicamentos em parceria com
o sector privado nacional e internacional. O acesso aos medicamentos deve ser
uma prioridade nacional e independente da disponibilidade do financiamento dos
parceiros da cooperação internacional. Não se pode ficar eternamente depende do
auxílio externo para se providenciar medicamentos básicos aos cidadãos.
Na
minha opinião, as Faculdades de medicina e os respectivos hospitais universitários
deveriam merecer uma prioridade na elevação dos seus orçamentos de
funcionamento e de investimento de modo a aumentar drasticamente o número de
vagas que oferecem anualmente para a formação de mais médicos e poderem pagar
melhores salários aos seus profissionais os quais deveriam ser incentivados a
trabalharem em regime de exclusividade. Ninguém em sã consciência deverá ficar
satisfeito e conformado com o actual número de estudantes de medicina que
ingressam e saem das nossas Faculdades. É urgente atrair, de forma mais ousada,
mais médicos e mais professores de medicina principalmente da China, Cuba, Índia
e outros países asiáticos com excedentes de pessoal médico para suprir as
nossas carências em médicos e muito em particular na formação de médicos e de
outros profissionais de saúde. É urgente passar da retórica à prática e sem
preconceitos e nem tabus assumir-se que ao ritmo actual de formação de médicos
não se vai muito longe nem a médio e nem sequer a longo prazo.
Ainda
no âmbito da proposta acima explanada defendo também a implantação de programas
de TELESAÚDE, que consistiria em instalar-se Centros de Informática que possibilitem
a ligação dos médicos especialistas e dos médicos estagiários aos outros médicos
e estagiários afectos aos distritos das respectivas regiões de modo a criar a possibilidade
de os médicos interagirem e esclarecerem dúvidas momentâneas, auxiliarem-se
mutuamente em algumas intervenções de pequena e média cirurgia e na actualização
e intercâmbio científico entre os profissionais de saúde espalhados pelos
distritos. Ter um computador e estar ligado a internet não deveria ser um luxo,
a todos os médicos e outros profissionais de saúde dever-se-ia atribuir esse
direito. As operadoras de telefonia móvel a operar em território nacional deveriam
ser encorajadas a custear os encargos com a linha verde (gratuita) que
possibilitasse a ligação permanente entre os médicos afectos aos distritos e o Centro
de Informática sediado nos hospitais universitários. A Televisão de Moçambique e
a Rádio de Moçambique deveriam também reorientar os seus programas de saúde pública
de modo a conciliar os seus conteúdos e os objectivos pretendidos com os dos
hospitais universitários.
Acredito
que deste modo ou de acordo com outras ideias que virem a surgir neste âmbito poderíamos
elevar em parte a qualidade do Serviço Nacional de Saúde.
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